DA LAGOA DO MATO PARA O MUNDO
DESABROCHA UM COMETA PEREGRINO,
ENCANTADO NA FORMA DE UM MENINO
QUE DA PEDRA NASCEU PRA SER FECUNDO
E TORNA-SE DOS VATES, O MAIS PROFUNDO,
SÓ NOS DANDO MOTIVO DE ALEGRIA.
PELOS VERSOS DE LUZ QUE ELE CRIA,
NOS ORGULHA EM DIZER COM VOZ ATIVA:
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
NÃO RELUTO COM TAL COMPARAÇÃO,
PELO SER INSPIRADO QUE ELE É.
E NA CERTA O GÊNIO DO ASSARÉ
VAI LOUVAR ESSA MINHA AFIRMAÇÃO,
E ALEGRE DOS CÉUS LHE ESTENDE A MÃO,
DANDO-LHE BENÇÃO DE LUZ COM HARMONIA.
E SEUS VERSOS, INSPIRADOS A CADA DIA,
JUSTIFICAM ESSA MINHA AFIRMATIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
SOBRE AS RODAS DO TEMPO DIVAGOU
IMERGINDO NUM MUNDO IMAGINÁRIO,
PARAÍSO DISTANTE DO CALVÁRIO
QUE DEPOIS DE ADÃO AQUI FICOU.
AO SENTIR QUE ERA SONHO ATÉ CHOROU,
NÃO QUERENDO MATAR A FANTASIA.
NO SEU MUNDO, O SONHO FICARIA
EM SEUS VERSOS DE PAZ REFLEXIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
NOS SEUS VERSOS A DOSE DE AMOR
VEM COM FORÇA DOS MEIOS DIVINAIS.
COMPARANDO O HOMEM AOS ANIMAIS,
COM RAZÃO O HUMANO É PERDEDOR.
E NA CASA DO POBRE SOFREDOR,
CRITICOU, COM AMOR E IRONIA
O ORGULHO QUE, EM VÃO, O HOMEM CRIA,
NUMA ILHA AMARELA E OPRESSIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
COM MOEDAS DE OURO SE FUNDIU,
DESCOBRINDO A OITAVA MARAVILHA.
E NA TERRA DO SAL FEZ SUA ILHA
ONDE SONHOS EM VERSOS PRODUZIU.
NOUTROS MUNDOS UTÓPICOS RESIDIU
VENDO DANTE NUM VÉU DE FANTASIA.
E, SONHANDO, UMA ARCA CONSTRUÍA
PRA NAS TERRAS DOS CEGOS, SER LUZ VIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
NOS MOSTROU COMO É TRISTE ANDAR DE LADO,
AO CONTRÁRIO DO HOMEM DE BELÉM
QUE ANDAVA PRA FRENTE E MUITO BEM,
MESMO O MUNDO GRITANDO: “ESTÁ ERRADO”.
E CONTOU NO SEU “CONTO BEM CONTADO”
QUE ANDAR DESSE JEITO NÃO PODIA.
JÁ QUE O CERTO, ERRADO PARECIA,
SEU MARTÍRIO ERA A ÚNICA ALTERNATIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
E O PINGO DE AMOR QUE ESTÁ FALTANDO,
ELE TRAZ PARA NÓS EM CADA VERSO.
E NUM BRADO DE PAZ AO UNIVERSO,
POR AMOR, O SEU GRITO ESTÁ CLAMANDO
E NO PEITO DO HOMEM DERRAMANDO
UMA GOTA DE LUZ A CADA DIA.
PRA QUEM VERSA, SEUS VERSOS SÃO O GUIA
QUE LHE INSPIRAM A VERSAR DE FORMA ALTIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
O SEU NOME HOJE É ÍCONE NACIONAL
POR TER TÍTULO DE IMORTALIDADE.
SENDO SIMPLES GANHOU NOTORIEDADE
E MERECE TER MESMO UM PEDESTAL
BEM NO MEIO DA CAPITAL DO SAL
PRA O FUTURO SABER QUE ALI UM DIA,
HABITOU ESSE GÊNIO QUE HOJE CRIA
UMA OBRA DE PAZ COM ALMA VIVA.
O BRASIL TEM UM NOVO PATATIVA
ENCANTANDO COM SUA POESIA.
Chico Gabriel – 06/10/2010 .
AO POETA QUE POSSUI NA MENTE A PAZ DAS ESTRELAS E NA BOCA VOZ DO CORISCO. É TEIMOSO POR SER ANTÔNIO E FRANCO POR SER FRANCISCO.
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
terça-feira, 28 de setembro de 2010
OS TRINTAS ANOS DO "ARCO-ÍRIS"
HÁ TRINTA ANOS PASSADOS,
UMA FLOR DOS CÉUS SURGIA
E AS CORES DO ARCO-ÍRIS,
NAQUELA ROSA SE VIA.
E NA ÍRIS DOS SEUS OLHOS
SEU NOME JÁ EXISTIA.
PELOS ANOS, ELA, CRESCIA
COM BELEZA GENUÍNA.
E HOJE FAZ TRINTA ANOS
COMO UMA ROSA DIVINA,
JÁ SENDO MÃE DE DOIS FILHOS
E COM ROSTO DE MENINA.
É MENSAGEIRA E DIVINA
SACERDOTISA DO AMOR.
E NOS LUGARES AONDE VAI
É COMBATENTE DA DOR
PREGANDO COM ALEGRIA
A PAZ DO NOSSO SENHOR.
PAIRANDO COMO UMA CONDOR,
A SUA LUZ NOS CONDUZ.
BRADANDO POR ONDE PASSA,
AS PALAVRAS DE JESUS.
NA CERTA ESTÁ ENTRE NÓS
COMO UM ESPÍRITO DE LUZ
TEM NA SUA MENTE A LUZ
DOS MEIOS CELESTIAIS,
COM TRINTA ANOS DE VIDA
UMA GRANDE MISSÃO TRAZ,
DE FALAR SEMPRE DE DEUS
SEM SE CANSAR DO QUE FAZ.
UMA MENSAGEM DE PAZ
ELA SEMPRE TEM GUARDADA.
E MESMO SENDO COMPRIDA,
COM DETALHE É COMENTADA.
PRA DEPOIS LÊ SEM CANSAÇO,
PARTE DA BÍBLIA SAGRADA.
MAS, HOJE, NESTA JORNADA,
COM TÃO CALOROSO EVENTO,
PARA QUE NÃO ACONTEÇA
DE ALGUÉM FICAR SONOLENTO,
TORÇO PRA QUE ELA LEIA
SÓ O NOVO TESTAMENTO.
POR FIM CLAMO AO FIRMAMENTO
AO NOSSO DEUS, PAI DOS PAIS,
QUE ELE MANDE UMA CENTELHA
NOS RAIOS QUE A LUA TRAZ,
DERRAMANDO SOBRE ELA,
SAÚDE, ALEGRIA E PAZ.
Chico Gabriel – 22/12/2009.
UMA FLOR DOS CÉUS SURGIA
E AS CORES DO ARCO-ÍRIS,
NAQUELA ROSA SE VIA.
E NA ÍRIS DOS SEUS OLHOS
SEU NOME JÁ EXISTIA.
PELOS ANOS, ELA, CRESCIA
COM BELEZA GENUÍNA.
E HOJE FAZ TRINTA ANOS
COMO UMA ROSA DIVINA,
JÁ SENDO MÃE DE DOIS FILHOS
E COM ROSTO DE MENINA.
É MENSAGEIRA E DIVINA
SACERDOTISA DO AMOR.
E NOS LUGARES AONDE VAI
É COMBATENTE DA DOR
PREGANDO COM ALEGRIA
A PAZ DO NOSSO SENHOR.
PAIRANDO COMO UMA CONDOR,
A SUA LUZ NOS CONDUZ.
BRADANDO POR ONDE PASSA,
AS PALAVRAS DE JESUS.
NA CERTA ESTÁ ENTRE NÓS
COMO UM ESPÍRITO DE LUZ
TEM NA SUA MENTE A LUZ
DOS MEIOS CELESTIAIS,
COM TRINTA ANOS DE VIDA
UMA GRANDE MISSÃO TRAZ,
DE FALAR SEMPRE DE DEUS
SEM SE CANSAR DO QUE FAZ.
UMA MENSAGEM DE PAZ
ELA SEMPRE TEM GUARDADA.
E MESMO SENDO COMPRIDA,
COM DETALHE É COMENTADA.
PRA DEPOIS LÊ SEM CANSAÇO,
PARTE DA BÍBLIA SAGRADA.
MAS, HOJE, NESTA JORNADA,
COM TÃO CALOROSO EVENTO,
PARA QUE NÃO ACONTEÇA
DE ALGUÉM FICAR SONOLENTO,
TORÇO PRA QUE ELA LEIA
SÓ O NOVO TESTAMENTO.
POR FIM CLAMO AO FIRMAMENTO
AO NOSSO DEUS, PAI DOS PAIS,
QUE ELE MANDE UMA CENTELHA
NOS RAIOS QUE A LUA TRAZ,
DERRAMANDO SOBRE ELA,
SAÚDE, ALEGRIA E PAZ.
Chico Gabriel – 22/12/2009.
terça-feira, 14 de setembro de 2010
UM BUQUÊ PARA UMA FLOR
QUERO OFERTAR-TE UM BUQUÊ
MESMO SENDO IMAGINÁRIO,
FAZ DE CONTA QUE ELE ESTÁ
ENFEITANDO ESTE CENÁRIO
FELIZ POR VER UMA FLOR
FAZER SEU ANIVERSÁRIO.
ESSE BUQUÊ NINGUÉM VER
COM OS OLHOS DA RAZÃO,
JÁ QUE ELE É FEITO COM ROSAS
DO JARDIM DA ILUSÃO,
SÓ ENXERGA ESSE BUQUÊ
QUEM VER COM O CORAÇÃO.
NÃO TROUXE FLORES DA TERRA
PRA NÃO TE CAUSAR CIÚME
POIS SENDO UM BUQUÊ REAL
PODERIAS TER QUEIXUME
SENTINDO O CHEIRO DAS ROSAS
COMPETIR COM TEU PERFUME.
ACEITE ENTÃO MEU BUQUÊ
COMO SENDO VERDADEIRO,
RETIRE UMA ROSA DELE
CHEIRE ELA POR INTEIRO,
QUE EU QUERO VER UMA FLOR
EM OUTRA FLOR DANDO CHEIRO.
Chico Gabriel – 28/10/2009..
MESMO SENDO IMAGINÁRIO,
FAZ DE CONTA QUE ELE ESTÁ
ENFEITANDO ESTE CENÁRIO
FELIZ POR VER UMA FLOR
FAZER SEU ANIVERSÁRIO.
ESSE BUQUÊ NINGUÉM VER
COM OS OLHOS DA RAZÃO,
JÁ QUE ELE É FEITO COM ROSAS
DO JARDIM DA ILUSÃO,
SÓ ENXERGA ESSE BUQUÊ
QUEM VER COM O CORAÇÃO.
NÃO TROUXE FLORES DA TERRA
PRA NÃO TE CAUSAR CIÚME
POIS SENDO UM BUQUÊ REAL
PODERIAS TER QUEIXUME
SENTINDO O CHEIRO DAS ROSAS
COMPETIR COM TEU PERFUME.
ACEITE ENTÃO MEU BUQUÊ
COMO SENDO VERDADEIRO,
RETIRE UMA ROSA DELE
CHEIRE ELA POR INTEIRO,
QUE EU QUERO VER UMA FLOR
EM OUTRA FLOR DANDO CHEIRO.
Chico Gabriel – 28/10/2009..
domingo, 5 de setembro de 2010
MORREU MARIA PREÁ - A RESPOSTA
UM COLEGA DE TRABALHO,
ME PEDIU PRA RECONTAR,
EM FORMA DE POESIA,
DO JEITO QUE SEI NARRAR,
UM CASO BEM ENGRAÇADO,
A RESPEITO DE UM DITADO,
DA CULTURA POPULAR.
“MORREU MARIA PREÁ”
DITADO BEM AFAMADO,
NO ENTANTO SUA ORIGEM,
NUNCA TINHA PESQUISADO,
ATÉ QUE ALGUEM PESQUISOU
E NUM FOLHETO CONTOU
TUDO QUE FOI APURADO.
O CASO É INTERESSANTE,
A PESQUISA É OBRA PRIMA
MAS EXAMINADOS OS VERSOS,
LENDO PRA BAIXO E PRA CIMA,
NÃO CONSEGUI ENCONTRAR,
ONDE O AUTOR QUIS MOSTRAR,
SEU ESTILO E SUA RIMA.
NUM INTERIOR PERDIDO,
UM PADRE BEM DEDICADO,
COM A BEATA MARIA
TINHA UM CHAMEGO DANADO,
MAS UM SACRISTÃO ESPERTO,
JÁ HAVIA DESCOBERTO
ESSE CASO CAMUFLADO.
ESSA BEATA MARIA
ERA MOÇA MUITO BELA,
E O PADRE SOLITÁRIO
DE REPENTE GAMOU NELA
E QUANDO A NOITE CHEGAVA
O PADRE NÃO DISPENSAVA
AS CARÍCIAS DA DONZELA.
NESSA PEQUENA CIDADE
TODOS QUE MORAVAM LÁ
TINHA QUE TER APELIDO
PARA O NOME “ACOMPANHÁ”
POR ISSO É QUE TODA VIDA,
MARIA FOI CONHECIDA
COMO “MARIA PREÁ”.
O SACRISTÃO ERA TIDO
COMO UM HOMEM DE RESPEITO,
PERANTE A SOCIEDADE
ERA UM CIDADÃO PERFEITO,
MAS, A FALTA DE PERDÃO,
DENTRO DO SEU CORAÇÃO,
ERA SEU GRANDE DEFEITO.
SABENDO ENTÃO DESTE CASO,
ESSE SACRISTÃO MALVADO,
VIVIA SUGANDO O PADRE,
DEIXANDO-O DESESPERADO,
E O PADRE EM DESVANTAGEM
CEDIA A SUA CHANTAGEM
PRA NÃO SER DESMASCARADO.
ENTÃO O POBRE VIGÁRIO
OROU A DEUS PAIS DOS PAIS,
QUE LHE TIRASSE ESSA CRUZ
QUE ERA PESADA DEMAIS
POIS AQUELE SACRISTÃO
TINHA UMA GRANDE AMBIÇÃO,
CADA VEZ QUERIA MAIS.
ASSIM, NO DIA SEGUINTE
QUE ESSE PEDIDO SE DEU,
O PADRE FOI VIAJAR,
QUANDO LOGO PERCEBEU
QUE ESQUECEU A PAPELADA
QUE ESTAVA PREPARADA
PARA O COMPROMISSO SEU.
SENDO ASSIM, NEM PENSOU MUITO
LOGO RESOLVEU VOLTAR
E CHEGANDO A SUA IGREJA,
BEM AO LADO DO ALTAR,
VIU UMA CENA TÃO FEIA,
QUE FALTOU SANGUE NA VEIA
E NÃO QUIS ACREDITAR.
POR DETRÁS DA SACRISTIA
ESCORADO NUM PILAR
AVISTOU SEU SACRISTÃO
NUM CHAMEGO DE LASCAR,
NEM EM PÉ E NEM DEITADO
NEM VESTIDO, NEM PELADO
COM UM MACHO A NAMORAR.
O PADRE VIU ESSA CENA
E FICOU HORRORIZADO
NA HORA ATÉ SENTIU PENA
DESSE SACRISTÃO COITADO,
E, SE NÃO TIVESSE SOFRENDO
COM O QUE VINHA ACONTECENDO
TINHA LOGO PERDOADO.
POREM SUA GRANDE CHANCE
TAVA ACONTECENDO LÁ,
ENTÃO PENSOU MAIS UM POUCO
ANDOU PRA LÁ E PRA CÁ,
DISSE AO SACRISTÃO “LEVANTE”
POREM DE AGORA POR DIANTE,
“MORREU MARIA PREÁ”. Chico Ribeiro – 19/08/2007.
Obs. Procurei não repetir nenhum verso do original, nem tão pouco fugir do assunto, nem ser pornográfico, espero que gostes!
ME PEDIU PRA RECONTAR,
EM FORMA DE POESIA,
DO JEITO QUE SEI NARRAR,
UM CASO BEM ENGRAÇADO,
A RESPEITO DE UM DITADO,
DA CULTURA POPULAR.
“MORREU MARIA PREÁ”
DITADO BEM AFAMADO,
NO ENTANTO SUA ORIGEM,
NUNCA TINHA PESQUISADO,
ATÉ QUE ALGUEM PESQUISOU
E NUM FOLHETO CONTOU
TUDO QUE FOI APURADO.
O CASO É INTERESSANTE,
A PESQUISA É OBRA PRIMA
MAS EXAMINADOS OS VERSOS,
LENDO PRA BAIXO E PRA CIMA,
NÃO CONSEGUI ENCONTRAR,
ONDE O AUTOR QUIS MOSTRAR,
SEU ESTILO E SUA RIMA.
NUM INTERIOR PERDIDO,
UM PADRE BEM DEDICADO,
COM A BEATA MARIA
TINHA UM CHAMEGO DANADO,
MAS UM SACRISTÃO ESPERTO,
JÁ HAVIA DESCOBERTO
ESSE CASO CAMUFLADO.
ESSA BEATA MARIA
ERA MOÇA MUITO BELA,
E O PADRE SOLITÁRIO
DE REPENTE GAMOU NELA
E QUANDO A NOITE CHEGAVA
O PADRE NÃO DISPENSAVA
AS CARÍCIAS DA DONZELA.
NESSA PEQUENA CIDADE
TODOS QUE MORAVAM LÁ
TINHA QUE TER APELIDO
PARA O NOME “ACOMPANHÁ”
POR ISSO É QUE TODA VIDA,
MARIA FOI CONHECIDA
COMO “MARIA PREÁ”.
O SACRISTÃO ERA TIDO
COMO UM HOMEM DE RESPEITO,
PERANTE A SOCIEDADE
ERA UM CIDADÃO PERFEITO,
MAS, A FALTA DE PERDÃO,
DENTRO DO SEU CORAÇÃO,
ERA SEU GRANDE DEFEITO.
SABENDO ENTÃO DESTE CASO,
ESSE SACRISTÃO MALVADO,
VIVIA SUGANDO O PADRE,
DEIXANDO-O DESESPERADO,
E O PADRE EM DESVANTAGEM
CEDIA A SUA CHANTAGEM
PRA NÃO SER DESMASCARADO.
ENTÃO O POBRE VIGÁRIO
OROU A DEUS PAIS DOS PAIS,
QUE LHE TIRASSE ESSA CRUZ
QUE ERA PESADA DEMAIS
POIS AQUELE SACRISTÃO
TINHA UMA GRANDE AMBIÇÃO,
CADA VEZ QUERIA MAIS.
ASSIM, NO DIA SEGUINTE
QUE ESSE PEDIDO SE DEU,
O PADRE FOI VIAJAR,
QUANDO LOGO PERCEBEU
QUE ESQUECEU A PAPELADA
QUE ESTAVA PREPARADA
PARA O COMPROMISSO SEU.
SENDO ASSIM, NEM PENSOU MUITO
LOGO RESOLVEU VOLTAR
E CHEGANDO A SUA IGREJA,
BEM AO LADO DO ALTAR,
VIU UMA CENA TÃO FEIA,
QUE FALTOU SANGUE NA VEIA
E NÃO QUIS ACREDITAR.
POR DETRÁS DA SACRISTIA
ESCORADO NUM PILAR
AVISTOU SEU SACRISTÃO
NUM CHAMEGO DE LASCAR,
NEM EM PÉ E NEM DEITADO
NEM VESTIDO, NEM PELADO
COM UM MACHO A NAMORAR.
O PADRE VIU ESSA CENA
E FICOU HORRORIZADO
NA HORA ATÉ SENTIU PENA
DESSE SACRISTÃO COITADO,
E, SE NÃO TIVESSE SOFRENDO
COM O QUE VINHA ACONTECENDO
TINHA LOGO PERDOADO.
POREM SUA GRANDE CHANCE
TAVA ACONTECENDO LÁ,
ENTÃO PENSOU MAIS UM POUCO
ANDOU PRA LÁ E PRA CÁ,
DISSE AO SACRISTÃO “LEVANTE”
POREM DE AGORA POR DIANTE,
“MORREU MARIA PREÁ”. Chico Ribeiro – 19/08/2007.
Obs. Procurei não repetir nenhum verso do original, nem tão pouco fugir do assunto, nem ser pornográfico, espero que gostes!
sábado, 4 de setembro de 2010
A IDADE DO HOMEM
UM AMIGO MEU ME DISSE
QUE ESTÁ MUITO CONTENTE,
POIS, SE CASOU NOVAMENTE
E SE ESQUECEU DA VELHICE.
E DA SUA MENINICE
ACENDEU DE NOVO A CHAMA,
TUDO PORQUE SUA DAMA
TEM BELEZA E MOCIDADE
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
TUDO NELE ESTÁ MUDADO,
ATÉ PARECE UM RAPAZ,
SUAS ROUPAS SOCIAIS,
FORAM DEIXADAS DE LADO.
SÓ ANDA AGORA APERTADO
E NEM DO CALOR RECLAMA.
DE VELHO, NINGUÉM LHE CHAMA,
DISFARÇA BEM, É VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
QUEM LHE VIU TEMPOS ATRÁS
COM CABELOS COR DE GELO
VAI SER RUIM DE CONHECÊ-LO.
POIS, TÁ MUDADO DE MAIS,
OS SEUS CABELOS ATUAIS,
DE RELUZENTES TEM FAMA.
TUDO FEZ POR SUA DAMA
NÃO FOI PELA VAIDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
AS SUAS MÚSICAS DOLENTES
QUASE NÃO ESCUTA MAIS.
OS SEUS RITMOS ATUAIS,
AGORA SÃO RITMOS QUENTES.
SÃO EMBALOS DIFERENTES,
MAS DISSO ELE NÃO RECLAMA.
PRA TODA FESTA ELE CHAMA,
E VAI COM FELICIDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
ELE SEMPRE FOI ESPÍRITA,
MAS SUA MULHER AMADA,
NOUTRA FÉ FOI EDUCADA
E NISTO NÃO ACREDITA.
É PROTESTANTE CONVICTA
E OUTRA FÉ NÃO PROCLAMA.
ELE SEGUE A SUA DAMA.
MUDOU DE FÉ, É VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
TAMBÉM MUDOU SUA VIDA
E PRESA A SUA SAÚDE,
BEBIDA JÁ NÃO LHE ILUDE,
SÓ SUCO É SUA BEBIDA
É LIGHT A SUA COMIDA.
SÓ COME LEGUME E RAMA.
TÁ COM AVERSÃO À BHRAMA,
E SE EXERCITA A VONTADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
ERA TRISTE E CABISBAIXO
PORÉM, VOLTOU A SORRIR,
VOLTOU DE NOVO A SENTIR
AQUELE FOGO DE MACHO,
E DIZ ATÉ QUE SEU FACHO
ESTÁ MUITO BOM DE CHAMA,
SE SENTE UM RAPAZ NA CAMA.
PORÉM, TEM MAIS QUALIDADE,
QUE O HOMEM TEM IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
NUM ABRAÇO CALOROSO
SEU VIGOR É RENASCIDO,
E JÁ ESTÁ ESQUECIDO
DO TEMPO QUE FOI MEDROSO
SE SENTE TÃO PODEROSO
QUE FAZ INVEJA A OBAMA,
PRA VIDA A VIDA LHE CHAMA
E ELE ENCARA A VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
O PRESENTE É SEU FUTURO
QUER A VIDA NO MOMENTO,
GOSTA DE CURTIR O VENTO
E OLHAR O CÉU ESCURO,
DIZ QUE SE SENTE SEGURO
AO LADO SE SUA DAMA,
E SE DEPOIS LEVAR RAMA
ACEITA A REALIDADE
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
Chico Gabriel – 10/11/2009.
QUE ESTÁ MUITO CONTENTE,
POIS, SE CASOU NOVAMENTE
E SE ESQUECEU DA VELHICE.
E DA SUA MENINICE
ACENDEU DE NOVO A CHAMA,
TUDO PORQUE SUA DAMA
TEM BELEZA E MOCIDADE
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
TUDO NELE ESTÁ MUDADO,
ATÉ PARECE UM RAPAZ,
SUAS ROUPAS SOCIAIS,
FORAM DEIXADAS DE LADO.
SÓ ANDA AGORA APERTADO
E NEM DO CALOR RECLAMA.
DE VELHO, NINGUÉM LHE CHAMA,
DISFARÇA BEM, É VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
QUEM LHE VIU TEMPOS ATRÁS
COM CABELOS COR DE GELO
VAI SER RUIM DE CONHECÊ-LO.
POIS, TÁ MUDADO DE MAIS,
OS SEUS CABELOS ATUAIS,
DE RELUZENTES TEM FAMA.
TUDO FEZ POR SUA DAMA
NÃO FOI PELA VAIDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
AS SUAS MÚSICAS DOLENTES
QUASE NÃO ESCUTA MAIS.
OS SEUS RITMOS ATUAIS,
AGORA SÃO RITMOS QUENTES.
SÃO EMBALOS DIFERENTES,
MAS DISSO ELE NÃO RECLAMA.
PRA TODA FESTA ELE CHAMA,
E VAI COM FELICIDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
ELE SEMPRE FOI ESPÍRITA,
MAS SUA MULHER AMADA,
NOUTRA FÉ FOI EDUCADA
E NISTO NÃO ACREDITA.
É PROTESTANTE CONVICTA
E OUTRA FÉ NÃO PROCLAMA.
ELE SEGUE A SUA DAMA.
MUDOU DE FÉ, É VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
TAMBÉM MUDOU SUA VIDA
E PRESA A SUA SAÚDE,
BEBIDA JÁ NÃO LHE ILUDE,
SÓ SUCO É SUA BEBIDA
É LIGHT A SUA COMIDA.
SÓ COME LEGUME E RAMA.
TÁ COM AVERSÃO À BHRAMA,
E SE EXERCITA A VONTADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
ERA TRISTE E CABISBAIXO
PORÉM, VOLTOU A SORRIR,
VOLTOU DE NOVO A SENTIR
AQUELE FOGO DE MACHO,
E DIZ ATÉ QUE SEU FACHO
ESTÁ MUITO BOM DE CHAMA,
SE SENTE UM RAPAZ NA CAMA.
PORÉM, TEM MAIS QUALIDADE,
QUE O HOMEM TEM IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
NUM ABRAÇO CALOROSO
SEU VIGOR É RENASCIDO,
E JÁ ESTÁ ESQUECIDO
DO TEMPO QUE FOI MEDROSO
SE SENTE TÃO PODEROSO
QUE FAZ INVEJA A OBAMA,
PRA VIDA A VIDA LHE CHAMA
E ELE ENCARA A VERDADE,
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
O PRESENTE É SEU FUTURO
QUER A VIDA NO MOMENTO,
GOSTA DE CURTIR O VENTO
E OLHAR O CÉU ESCURO,
DIZ QUE SE SENTE SEGURO
AO LADO SE SUA DAMA,
E SE DEPOIS LEVAR RAMA
ACEITA A REALIDADE
QUE O HOMEM TEM A IDADE
DA MULHER QUE ELE AMA.
Chico Gabriel – 10/11/2009.
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
PINTO DO MONTEIRO
Severino Lourenço da Silva Pinto foi um poeta superlativo. Astuta raposa, cobra das mais venenosas. O seu poder de criação e a velocidade de raciocínio muitas vezes faziam as palavras tropeçarem umas nas outras, não pelo verso quebrado, absolutamente, mas quase engolindo sílabas, dada a ligeireza dos versos despejados em turbilhão. Autor de versos contundentes, tudo nele transpirava grandiosidade. Foi um gênio da cantoria.
Vídeos com Pinto do Monteiro:
Vídeo 1
Vídeo 2
A data de seu nascimento é incerta. Mas numa entrevista concedida a Djair de Almeida Freire, em 11/04/1983, na casa do poeta, ele revelou sua idade. Eis os principais trechos:
"Meu nome é Severino Lourenço da Silva Pinto Monteiro, nasci em 1895, a 21 de novembro, a uma da madrugada, assim dizia minha mãe. Batizei-me a primeiro de janeiro de 1896, pelo padre Manoel Ramos , na Vila de Monteiro. Nasci na rua, mas morava em Carnaubinha. Com sete anos de idade, em 1903, fui para a Fazenda Feijão. Saí de lá em 1916, 30 de junho. Meus avós eram da Itália. Quando chegaram por aqui se misturaram com sangue de português. Esse Monteiro é parente dos Brito, eu sou parente dos Brito".
Essa figura legendária, que atendia pelo nome de Pinto do Monteiro correu muito trecho pelo Brasil afora. Filho de um tropeiro com uma doméstica, Pinto experimentou muitas profissões, antes de se dedicar inteiramente à viola. A primeira foi de vaqueiro. Foi soldado de polícia, guarda de serviço contra a malária, auxiliar de enfermeiro, vendedor de cuscuz no Recife. "Depois larguei os cuscuz e ficava cantando na calçada do mercado de São José", declarara o próprio Pinto, certa vez. Recordava outra vez que, ao cantar como estreante, alguém o alertou: "Se você continuar, vai cantar de assombrar o mundo". E assombrou.
Ele tinha 25 anos quando começou a cantar. Foram seus mestres de cantoria Saturnino Mandu, de Poções (PE), Manoel Clementino, de Sumé (PB), e José de Lima em companhia de quem foi para o Recife onde cantou com muitos repentistas daquele Estado.
Em 1940, já tendo adquirido bastante experiência como cantador e mestre em cantoria, viajou para o Amazonas, onde até 1946 exerceu as funções de guarda do serviço contra a malária, ora em Porto Velho, ora em Guajaramirim, ora em Boa Vista. Quando voltou veio morar no Ceará. E em 1947 muda-se para Caruaru (PE). Depois mudou-se para Sertânea (PE), mais perto de Monteiro.
A característica marcante da cantoria de Pinto foi a naturalidade e rapidez de improviso. Cognominado "A Cascavel do Repente", Pinto era ágil, certeiro, veloz, e também venenoso e mortífero, deixando muitas vezes o oponente mudo e sem resposta. Numa ocasião, foi convidado a assistir a uma cantoria, em que um dos repentistas era Patativa, poeta ruim, cuja viola era toda enfeitada de fitas coloridas, Alguém pediu ao dono da casa que deixasse Pinto cantar. "Com a gente, não, não, só se for sozinho", defendeu-se a dupla. Pinto ficou em pé, no meio da sala, e disse:
Eu não sei como se ouve
Cantor como Patativa
Toda pronúncia é errada
Toda rima é negativa
A viola só tem fita
Mas a cantiga é merda viva".
A troca de "amabilidades" com qualquer que fosse o cantador era uma constante. Se o adversário era ruim, apertava o cerco. Se, por outra, era um do porte de Lourival Batista, a disputa fervia. Destemido, lutou contra cangaceiros, quando era da polícia. Mas, não chegou a lutar contra Lampião, pois somente quando estava no Acre, no serviço contra a malária, é que o famoso sertanejo entrou no cangaço.
A Cascavel do Monteiro esguio, estatura mediana, teve quatro mulheres. Nenhum filho, ao menos oficialmente. Aprendeu a ler e a escrever, já adulto, o que foi suficiente para aprimorar conhecimentos de história e geografia gerais, história antiga, história do Brasil. Gostava de escrever poemas e cartas aos amigos. Era um assombro de agilidade e insolência. Malcriado como sempre, acabava com o violeiro nas primeiras linhas.
Cantando em Caruaru, com Aristo José dos Santos, ouviu a estrofe que assim terminava: "moço comigo é na faca / velho comigo é no pau". Respondeu:
Mas eu sou como lacrau
Que do lixo se aproxima
Vivendo da umidade
Se alimentando do clima
Pra ver se um besta assim
Chega e bota o pé em cima.
Se provocado não tinha papas na língua nem conveniências. E o contendor era obrigado a recuar porque, com sua peculiar fertilidade de versejar, era capaz de fazer uma segunda sextilha antes que o outro se refizesse do choque da primeira resposta. Cantando uma vez com Joaquim Vitorino, este caiu na asneira de fazer referências às lapadas de cana de um primo seu. Pinto então fez esta sextilha, causando um certo desconforto no companheiro:
Você bebe até veneno!
Seu pai é bom troaqueiro,
Manoel, um ébrio afoito
Vive apanhando em Monteiro!
Quem tem uma corja desta
Não fala de cachaceiro.
A cantoria é uma manifestação muito criativa. E cantar de improviso requer muita agilidade de pensamento. E Pinto tinha tudo isso. Ele atravessou décadas cantando. Conheceu uma centena de repentistas, duelando com muitos deles. Desafiou grandes cantadores, como Lourival Batista, Dimas Batista, Pedro Amorim, Rogaciano Leite, Heleno Pinto (seu irmão), Antônio Marinho e muitos outros. "Eu assisti Pinto no auge, com Louro. Várias vezes. Nunca consegui saber qual dos dois estava na frente. No mínimo, era um empate", relembra Raimundo Patriota. E acrescenta: "Seguir o estilo de Pinto era muito difícil. Era um estilo muito pessoal. Muitos tentaram, mas não conseguiram". A verdade é que o nome de Pinto tomou-se um marco no universo da poesia improvisada do Nordeste. Diz-se que foi o maior.
Certa vez, ao ser perguntado sobre os maiores repentistas, Pinto não titubeou: "Foi o sogro e o genro" (referindo-se a Antonio Marinho e Lourival Batista). Com Job Patriota, foi mais direto: "Do meu tamanho mesmo, só Louro e Antônio Marinho. O resto é assim do seu tamanho". Quanto a Rogaciano Leite, considerado discípulo da Cascavel, Pinto coloca-o no rol dos grandes, chamando-o de "monstro".
João Furiba cantou muito com Pinto e não tinha medo de apanhar. No Festival de Violeiros de Olinda, em 1984, Furiba homenageou o mestre, presente ao acontecimento. "Seu verso hoje é açude / que abarrota a represa / rio que não perde a água / planta que possui beleza / gênio que desdobra o mundo / por conta da natureza".
Não se sabe, ao certo, com que idade Pinto morreu. Uns dizem que ele era de 1895, outros, de 1896. O próprio dizia que nasceu ora em 2 de novembro de 1896, ora em 21 de novembro de 1895. Afirma-se que morreu com mais de cem anos. Testemunhos dizem que era mais novo do que Antônio Marinho apenas dois anos. Conforme esse dado, Pinto teria morrido aos 101 anos, uma vez que Marinho é de 1887. Já velhinho, carregava um pandeiro para acompanhá-lo nos improvisos, alegando que "o volume é mais pequeno / e o pacote é mais maneiro".
Para alegria dos admiradores, Pinto deixou sua voz registrada em dois LP's — Pinto do Monteiro: Vida, Poesia e Verdade, produzido pela Fundação Joaquim Nabuco, e Pinto de Monteiro e Zé Pequeno: acelerando as asas do juízo, selo independente. Há, ainda, sua imagem e voz em inúmeras fitas de vídeo, Super-8, cassete, cinema. Deve haver, também, registro de muitos dos festivais dos quais participou, no Recife, São Paulo, João Pessoa, Fortaleza, Caruaru, Limoeiro, Petrolina, Campina Grande, entre outros.
No I Congresso de Cantadores do Recife, organizado por Rogaciano Leite, em 1948, no teatro de Santa Isabel, Pinto do Monteiro foi o grande vencedor, juntamente com o piauiense Domingos Martins Fonseca. Em dezembro de 1970, foi ao Festival de Cinema de Guarujá, com Lourival Batista, Job Patriota, Pedro Amorim, José Nunes Filho. Teve participação em filmes, entre eles, Nordeste: Cordel, Repente, Canção, dirigido por Tânia Quaresma.
Certa vez, Pinto cantando com um outro seu colega, este elogiava o Sertão, terra do velho cantador, e terminou uma sextilha assim: "Não sei medir o tamanho / dessa gente sertaneja". Pinto pega na deixa e diz, com sua maneira autêntica de sertanejo puro e de versos fáceis:
Que eu esteja em casa ou não esteja
chegue, entre e arme a rede
coma se estiver com fome
beba se estiver com sede
se quiser se balançar
empurre o pé na parede.
De outra feita, numa dessas suas grandes e ferrenhas lutas, em seu desafio o parceiro termina uma sextilha assim: "quando eu for para o outro mundo / vou lhe promover a galo". Facilmente, Pinto jogou esta sátira:
Se eu gozar desse regalo
concedido pela providência
quando eu for pra o outro mundo
havendo esta transferência
você vem como galinha
para a mesma residência.
Pinto era um verdadeiro cantador de repente. Bem diferente dos que normalmente conhecemos, que seguem uma rotina. Ele não. Respondia ao que lhe perguntam e revidava conforme lhe feriam. Numa cantoria, seu colega querendo atacá-lo, disse: "Aqui nesta cantoria / eu quero deixá-lo rouco". Pinto, com sua inesgotável idéia, responde:
Cantar com quem canta pouco
é como viajar numa pista
com um carro faltando freios
o chofer faltando a vista
e um doido gritando dentro:
"atola o pé motorista".
Em toda cantoria há o momento dos elogios, em que o cantador faz uma exaltação ao ouvinte, para agradá-lo e a paga ser recompensável. Era uma delas, o velho Pinto elogiava um sujeito e tudo fazia para agradá-lo. O camarada foi se retirando e não pagou. Pinto notou que ele tinha uma verruga no rosto e imediatamente soltou a dele, com esta sextilha:
Eu não posso confiar
em cabra que tem verruga
cachorro de boca preta
terreno que não enxuga
comida que doido enjeita
e casa que cigano aluga.
Sua viola era sagrada. Tinha um ciúme danado dela. Quando ele próprio sentiu que já estava próximo da morte, pois se encontrava muito doente, fez a seguinte recomendação à sua mulher:
Velhinha, quando eu morrer
Conserve a minha viola
Bote ela numa sacola
E deixe o rato roer
Barata dentro viver
O morcego morando nela
O cupim comento ela
E ela perdendo o valor
Só não deixe cantador
Bater mais nas cordas dela.
De 1988 até a morte, Pinto permaneceu em Monteiro. Já cego e paralítico, porém totalmente lúcido, entregou-se à morte por absoluta falta de opção, numa noite de domingo, 28 de outubro de 1990, após viver mais de nove décadas, pelo menos, e deixar seu nome inscrito nos anais da fama, como cantador dotado de muita agilidade mental e muita ironia.Seu derradeiro sonho era morrer em Pernambuco, próximo dos companheiros de viola. Não o realizou, mas garantiu que ficaria para semente, como, de fato, ficou, brotando na memória do improviso:
Quando os velhos morrem
Os que ficam cantam bem
Duda passou de Marinho
Por mim não passa ninguém.
Eu vou ficar pra semente
Prá séculos sem fim amém.
Eu vim lá do outro mundo
Pensando que este era lindo
Se tenho sido avisado
Pra aqui eu não tinha vindo
Como vim vou demorar
Só pra ver como é que findo.
--------------------------------------------------------------------------------
Numa cantoria, o parceiro de Pinto terminou o verso da seguinte forma:
Eis aí o Pinto Velho
Que é o rei do repente
Pinto disse:
Estou muito diferente
Do que já fui no passado
Vivendo um resto de vida
Como um macaco chumbado
Botando folha nos furos
Sem obter resultado.
--------------------------------------------------------------------------------
Cantando com Pinto, José Alves Sobrinho terminou uma sextilha com os seguintes versos:
Sou filho de Picuí
Minha terra é um jardim
Pinto respondeu:
Sua terra é muito ruim
Só dá quipá e urtiga
Planta milho, o milho nasce
Não cresce nem bota espiga
De legume de caroço
Só dá sarampo e bexiga.
--------------------------------------------------------------------------------
Josué da Cruz termina uma sextilha dizendo:
Em Campina Grande mora
Seu criado Josué
Pinto disse:
Eu sei que Campina é
Da Paraíba a estrela
Mas passei vinte e seis anos
Sem precisar conhecê-la
Inda me atrevo passar
Mas outro tanto sem vê-la.
--------------------------------------------------------------------------------
Cantando com Joaquim Vitorino, este terminou uma sextilha insultando Pinto:
Pinto você é tão ruim
Que com seu povo não mora
Pinto responde:
Porque daqui fui embora
É preciso que lhe prove
Fui assombrado com quinze
Com medo de dezenove
Pois nunca morei em terra
Que todo ano não chove.
VOLTE PRA RIBA
--------------------------------------------------------------------------------
Manoel Xudú, cantando com Pinto, terminou uma estrofe dizendo:
Por mais força que se tenha
Quem pega peso se abala
Pinto responde:
Ando com uma bengala
Com ela escoro uma perna
Pra não cair em buraco
Nem desabar em caverna
Sou o dono da bengala
Mas ela é quem me governa.
--------------------------------------------------------------------------------
Numa cantoria com João Furiba, este concluiu uma sextilha dizendo:
Namoro com quem vier
A mim você não empata
Pinto dá a resposta:
Tem uma mulher na Prata
Que há tempo perdeu o nome
Tem uma negra em Campina
Vive morrendo de fome
E carmelita em Sumé
Faz mais de mês que não come.
Furiba continua:
Agora encontrei na festa
Uma jovem que me adora
Pinto referindo-se a mulher, diz:
Ele namora a senhora
E outra que aparecer
A negra dele na Prata
Só tem faltado morrer
Lavando roupa de ganho
Pra vestir e pra comer.
VOLTE PRA RIBA
--------------------------------------------------------------------------------
Em outra cantoria, Furiba falando de Sumé, disse:
Falando do meu Sumé
Comigo você se arrasa
Pinto respondeu:
Vou construir minha casa
Na Serra da Carnaíba
De frente pra Pernambuco
De costas pra Paraíba
Só pra não ver duas coisas:
Nem Sumé nem João Furiba.
--------------------------------------------------------------------------------
“Antes de morrer, aos 94 anos, Pinto era visitado apenas, em sua modestíssima casa de Monteiro, por um cabo PM reformado, que ele chamava de “Cabo Edésio”. As outras visitas não eram de lá e sim de seus admiradores espalhados por todo canto do Brasil. Um dos últimos trabalhos do repentista, intitulado Porque deixei de cantar , é obra de gênio, de quem domina a arte poética até os últimos dias de sua vida.” (Inaldo Sampaio – JC caderno C 22/11/1996)
Deixei porque a idade
Já está muito avançada
A lembrança está cansada
E o som menos da metade
Perdi a felicidade
Que em moço eu possuía
Acabou-se a energia
Da máquina de fazer verso
Hoje vivo submerso
Num mar de melancolia
Minha amiga e companheira
Eu embrulhei num molambo
Pego nela por um bambo
Para tirar-lhe a poeira
Hoje não tem mais quem queira
Ir num canto me escutar
Fazer verso e gagueja
Topar no meio e no fim
Cantar feio, pouco e ruim
Será melhor não cantar.
Não foi por uma pensão
Que o governo me deu
Porque o eu do meu eu
Não me dá mais produção
Cantor sem inspiração
Tem vontade e nada faz
Afinal, sou um dos tais
Que ninguém quer assistir
Nem o povo quer ouvir
Nem eu também posso mais.
Por ocasião da morte de Pinto do Monteiro, o repentista Valdir Teles, fez este verso em homenagem ao velho cantador:
No momento em que Pinto faleceu
As violas pararam de tocar
Deus mandou o Nordeste se enlutar
Respeitando o valor do nome seu
Pernambuco ao saber entristeceu
Paraíba até hoje está doente
Só tem galo cantando atualmente
Porque Pinto mudou-se do poleiro
Com a morte de Pinto do Monteiro
Abalou-se o império do repente.
Eu comparo esta vida
à curva da letra S:
tem uma ponta que sobe
tem outra ponta que desce
e a volta que dá no meio
nem todo mundo conhece
Esta palavra saudade
conheço desde criança
saudade de amor ausente
não é saudade (é lembrança)
saudade só é saudade
quando morre a esperança
Aonde eu chego, não vi
Mal que não desapareça
Raposa que não se esconda
Bravo que não me obedeça
Letrado que não me escute
Cantor que não endoideça
Cantar com quem canta pouco
é viajar numa pista
com um carro faltando freios
o chofer faltando a vista
e um doido gritando dentro
atola o pé motorista
Minha corda não se estica
não se tora nem se enverga
da terra pro firmamento
meu pensamento se alberga
em um lugar tão distante
que lente nenhuma enxerga
Eu vou fazer uma casa
na Serra da Carnaíba
a frente pra Pernambuco
as costas pra Paraíba
só pra não ver duas coisas:
Nem Sumé, nem João Furiba
Há vários dias que ando,
Com o satanás na corcunda:
Pois, hoje, almocei na casa
Duma negra tão imunda,
Que a prensa de espremer queijo
Era as bochechas da bunda!
Vídeos com Pinto do Monteiro:
Vídeo 1
Vídeo 2
A data de seu nascimento é incerta. Mas numa entrevista concedida a Djair de Almeida Freire, em 11/04/1983, na casa do poeta, ele revelou sua idade. Eis os principais trechos:
"Meu nome é Severino Lourenço da Silva Pinto Monteiro, nasci em 1895, a 21 de novembro, a uma da madrugada, assim dizia minha mãe. Batizei-me a primeiro de janeiro de 1896, pelo padre Manoel Ramos , na Vila de Monteiro. Nasci na rua, mas morava em Carnaubinha. Com sete anos de idade, em 1903, fui para a Fazenda Feijão. Saí de lá em 1916, 30 de junho. Meus avós eram da Itália. Quando chegaram por aqui se misturaram com sangue de português. Esse Monteiro é parente dos Brito, eu sou parente dos Brito".
Essa figura legendária, que atendia pelo nome de Pinto do Monteiro correu muito trecho pelo Brasil afora. Filho de um tropeiro com uma doméstica, Pinto experimentou muitas profissões, antes de se dedicar inteiramente à viola. A primeira foi de vaqueiro. Foi soldado de polícia, guarda de serviço contra a malária, auxiliar de enfermeiro, vendedor de cuscuz no Recife. "Depois larguei os cuscuz e ficava cantando na calçada do mercado de São José", declarara o próprio Pinto, certa vez. Recordava outra vez que, ao cantar como estreante, alguém o alertou: "Se você continuar, vai cantar de assombrar o mundo". E assombrou.
Ele tinha 25 anos quando começou a cantar. Foram seus mestres de cantoria Saturnino Mandu, de Poções (PE), Manoel Clementino, de Sumé (PB), e José de Lima em companhia de quem foi para o Recife onde cantou com muitos repentistas daquele Estado.
Em 1940, já tendo adquirido bastante experiência como cantador e mestre em cantoria, viajou para o Amazonas, onde até 1946 exerceu as funções de guarda do serviço contra a malária, ora em Porto Velho, ora em Guajaramirim, ora em Boa Vista. Quando voltou veio morar no Ceará. E em 1947 muda-se para Caruaru (PE). Depois mudou-se para Sertânea (PE), mais perto de Monteiro.
A característica marcante da cantoria de Pinto foi a naturalidade e rapidez de improviso. Cognominado "A Cascavel do Repente", Pinto era ágil, certeiro, veloz, e também venenoso e mortífero, deixando muitas vezes o oponente mudo e sem resposta. Numa ocasião, foi convidado a assistir a uma cantoria, em que um dos repentistas era Patativa, poeta ruim, cuja viola era toda enfeitada de fitas coloridas, Alguém pediu ao dono da casa que deixasse Pinto cantar. "Com a gente, não, não, só se for sozinho", defendeu-se a dupla. Pinto ficou em pé, no meio da sala, e disse:
Eu não sei como se ouve
Cantor como Patativa
Toda pronúncia é errada
Toda rima é negativa
A viola só tem fita
Mas a cantiga é merda viva".
A troca de "amabilidades" com qualquer que fosse o cantador era uma constante. Se o adversário era ruim, apertava o cerco. Se, por outra, era um do porte de Lourival Batista, a disputa fervia. Destemido, lutou contra cangaceiros, quando era da polícia. Mas, não chegou a lutar contra Lampião, pois somente quando estava no Acre, no serviço contra a malária, é que o famoso sertanejo entrou no cangaço.
A Cascavel do Monteiro esguio, estatura mediana, teve quatro mulheres. Nenhum filho, ao menos oficialmente. Aprendeu a ler e a escrever, já adulto, o que foi suficiente para aprimorar conhecimentos de história e geografia gerais, história antiga, história do Brasil. Gostava de escrever poemas e cartas aos amigos. Era um assombro de agilidade e insolência. Malcriado como sempre, acabava com o violeiro nas primeiras linhas.
Cantando em Caruaru, com Aristo José dos Santos, ouviu a estrofe que assim terminava: "moço comigo é na faca / velho comigo é no pau". Respondeu:
Mas eu sou como lacrau
Que do lixo se aproxima
Vivendo da umidade
Se alimentando do clima
Pra ver se um besta assim
Chega e bota o pé em cima.
Se provocado não tinha papas na língua nem conveniências. E o contendor era obrigado a recuar porque, com sua peculiar fertilidade de versejar, era capaz de fazer uma segunda sextilha antes que o outro se refizesse do choque da primeira resposta. Cantando uma vez com Joaquim Vitorino, este caiu na asneira de fazer referências às lapadas de cana de um primo seu. Pinto então fez esta sextilha, causando um certo desconforto no companheiro:
Você bebe até veneno!
Seu pai é bom troaqueiro,
Manoel, um ébrio afoito
Vive apanhando em Monteiro!
Quem tem uma corja desta
Não fala de cachaceiro.
A cantoria é uma manifestação muito criativa. E cantar de improviso requer muita agilidade de pensamento. E Pinto tinha tudo isso. Ele atravessou décadas cantando. Conheceu uma centena de repentistas, duelando com muitos deles. Desafiou grandes cantadores, como Lourival Batista, Dimas Batista, Pedro Amorim, Rogaciano Leite, Heleno Pinto (seu irmão), Antônio Marinho e muitos outros. "Eu assisti Pinto no auge, com Louro. Várias vezes. Nunca consegui saber qual dos dois estava na frente. No mínimo, era um empate", relembra Raimundo Patriota. E acrescenta: "Seguir o estilo de Pinto era muito difícil. Era um estilo muito pessoal. Muitos tentaram, mas não conseguiram". A verdade é que o nome de Pinto tomou-se um marco no universo da poesia improvisada do Nordeste. Diz-se que foi o maior.
Certa vez, ao ser perguntado sobre os maiores repentistas, Pinto não titubeou: "Foi o sogro e o genro" (referindo-se a Antonio Marinho e Lourival Batista). Com Job Patriota, foi mais direto: "Do meu tamanho mesmo, só Louro e Antônio Marinho. O resto é assim do seu tamanho". Quanto a Rogaciano Leite, considerado discípulo da Cascavel, Pinto coloca-o no rol dos grandes, chamando-o de "monstro".
João Furiba cantou muito com Pinto e não tinha medo de apanhar. No Festival de Violeiros de Olinda, em 1984, Furiba homenageou o mestre, presente ao acontecimento. "Seu verso hoje é açude / que abarrota a represa / rio que não perde a água / planta que possui beleza / gênio que desdobra o mundo / por conta da natureza".
Não se sabe, ao certo, com que idade Pinto morreu. Uns dizem que ele era de 1895, outros, de 1896. O próprio dizia que nasceu ora em 2 de novembro de 1896, ora em 21 de novembro de 1895. Afirma-se que morreu com mais de cem anos. Testemunhos dizem que era mais novo do que Antônio Marinho apenas dois anos. Conforme esse dado, Pinto teria morrido aos 101 anos, uma vez que Marinho é de 1887. Já velhinho, carregava um pandeiro para acompanhá-lo nos improvisos, alegando que "o volume é mais pequeno / e o pacote é mais maneiro".
Para alegria dos admiradores, Pinto deixou sua voz registrada em dois LP's — Pinto do Monteiro: Vida, Poesia e Verdade, produzido pela Fundação Joaquim Nabuco, e Pinto de Monteiro e Zé Pequeno: acelerando as asas do juízo, selo independente. Há, ainda, sua imagem e voz em inúmeras fitas de vídeo, Super-8, cassete, cinema. Deve haver, também, registro de muitos dos festivais dos quais participou, no Recife, São Paulo, João Pessoa, Fortaleza, Caruaru, Limoeiro, Petrolina, Campina Grande, entre outros.
No I Congresso de Cantadores do Recife, organizado por Rogaciano Leite, em 1948, no teatro de Santa Isabel, Pinto do Monteiro foi o grande vencedor, juntamente com o piauiense Domingos Martins Fonseca. Em dezembro de 1970, foi ao Festival de Cinema de Guarujá, com Lourival Batista, Job Patriota, Pedro Amorim, José Nunes Filho. Teve participação em filmes, entre eles, Nordeste: Cordel, Repente, Canção, dirigido por Tânia Quaresma.
Certa vez, Pinto cantando com um outro seu colega, este elogiava o Sertão, terra do velho cantador, e terminou uma sextilha assim: "Não sei medir o tamanho / dessa gente sertaneja". Pinto pega na deixa e diz, com sua maneira autêntica de sertanejo puro e de versos fáceis:
Que eu esteja em casa ou não esteja
chegue, entre e arme a rede
coma se estiver com fome
beba se estiver com sede
se quiser se balançar
empurre o pé na parede.
De outra feita, numa dessas suas grandes e ferrenhas lutas, em seu desafio o parceiro termina uma sextilha assim: "quando eu for para o outro mundo / vou lhe promover a galo". Facilmente, Pinto jogou esta sátira:
Se eu gozar desse regalo
concedido pela providência
quando eu for pra o outro mundo
havendo esta transferência
você vem como galinha
para a mesma residência.
Pinto era um verdadeiro cantador de repente. Bem diferente dos que normalmente conhecemos, que seguem uma rotina. Ele não. Respondia ao que lhe perguntam e revidava conforme lhe feriam. Numa cantoria, seu colega querendo atacá-lo, disse: "Aqui nesta cantoria / eu quero deixá-lo rouco". Pinto, com sua inesgotável idéia, responde:
Cantar com quem canta pouco
é como viajar numa pista
com um carro faltando freios
o chofer faltando a vista
e um doido gritando dentro:
"atola o pé motorista".
Em toda cantoria há o momento dos elogios, em que o cantador faz uma exaltação ao ouvinte, para agradá-lo e a paga ser recompensável. Era uma delas, o velho Pinto elogiava um sujeito e tudo fazia para agradá-lo. O camarada foi se retirando e não pagou. Pinto notou que ele tinha uma verruga no rosto e imediatamente soltou a dele, com esta sextilha:
Eu não posso confiar
em cabra que tem verruga
cachorro de boca preta
terreno que não enxuga
comida que doido enjeita
e casa que cigano aluga.
Sua viola era sagrada. Tinha um ciúme danado dela. Quando ele próprio sentiu que já estava próximo da morte, pois se encontrava muito doente, fez a seguinte recomendação à sua mulher:
Velhinha, quando eu morrer
Conserve a minha viola
Bote ela numa sacola
E deixe o rato roer
Barata dentro viver
O morcego morando nela
O cupim comento ela
E ela perdendo o valor
Só não deixe cantador
Bater mais nas cordas dela.
De 1988 até a morte, Pinto permaneceu em Monteiro. Já cego e paralítico, porém totalmente lúcido, entregou-se à morte por absoluta falta de opção, numa noite de domingo, 28 de outubro de 1990, após viver mais de nove décadas, pelo menos, e deixar seu nome inscrito nos anais da fama, como cantador dotado de muita agilidade mental e muita ironia.Seu derradeiro sonho era morrer em Pernambuco, próximo dos companheiros de viola. Não o realizou, mas garantiu que ficaria para semente, como, de fato, ficou, brotando na memória do improviso:
Quando os velhos morrem
Os que ficam cantam bem
Duda passou de Marinho
Por mim não passa ninguém.
Eu vou ficar pra semente
Prá séculos sem fim amém.
Eu vim lá do outro mundo
Pensando que este era lindo
Se tenho sido avisado
Pra aqui eu não tinha vindo
Como vim vou demorar
Só pra ver como é que findo.
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Numa cantoria, o parceiro de Pinto terminou o verso da seguinte forma:
Eis aí o Pinto Velho
Que é o rei do repente
Pinto disse:
Estou muito diferente
Do que já fui no passado
Vivendo um resto de vida
Como um macaco chumbado
Botando folha nos furos
Sem obter resultado.
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Cantando com Pinto, José Alves Sobrinho terminou uma sextilha com os seguintes versos:
Sou filho de Picuí
Minha terra é um jardim
Pinto respondeu:
Sua terra é muito ruim
Só dá quipá e urtiga
Planta milho, o milho nasce
Não cresce nem bota espiga
De legume de caroço
Só dá sarampo e bexiga.
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Josué da Cruz termina uma sextilha dizendo:
Em Campina Grande mora
Seu criado Josué
Pinto disse:
Eu sei que Campina é
Da Paraíba a estrela
Mas passei vinte e seis anos
Sem precisar conhecê-la
Inda me atrevo passar
Mas outro tanto sem vê-la.
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Cantando com Joaquim Vitorino, este terminou uma sextilha insultando Pinto:
Pinto você é tão ruim
Que com seu povo não mora
Pinto responde:
Porque daqui fui embora
É preciso que lhe prove
Fui assombrado com quinze
Com medo de dezenove
Pois nunca morei em terra
Que todo ano não chove.
VOLTE PRA RIBA
--------------------------------------------------------------------------------
Manoel Xudú, cantando com Pinto, terminou uma estrofe dizendo:
Por mais força que se tenha
Quem pega peso se abala
Pinto responde:
Ando com uma bengala
Com ela escoro uma perna
Pra não cair em buraco
Nem desabar em caverna
Sou o dono da bengala
Mas ela é quem me governa.
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Numa cantoria com João Furiba, este concluiu uma sextilha dizendo:
Namoro com quem vier
A mim você não empata
Pinto dá a resposta:
Tem uma mulher na Prata
Que há tempo perdeu o nome
Tem uma negra em Campina
Vive morrendo de fome
E carmelita em Sumé
Faz mais de mês que não come.
Furiba continua:
Agora encontrei na festa
Uma jovem que me adora
Pinto referindo-se a mulher, diz:
Ele namora a senhora
E outra que aparecer
A negra dele na Prata
Só tem faltado morrer
Lavando roupa de ganho
Pra vestir e pra comer.
VOLTE PRA RIBA
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Em outra cantoria, Furiba falando de Sumé, disse:
Falando do meu Sumé
Comigo você se arrasa
Pinto respondeu:
Vou construir minha casa
Na Serra da Carnaíba
De frente pra Pernambuco
De costas pra Paraíba
Só pra não ver duas coisas:
Nem Sumé nem João Furiba.
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“Antes de morrer, aos 94 anos, Pinto era visitado apenas, em sua modestíssima casa de Monteiro, por um cabo PM reformado, que ele chamava de “Cabo Edésio”. As outras visitas não eram de lá e sim de seus admiradores espalhados por todo canto do Brasil. Um dos últimos trabalhos do repentista, intitulado Porque deixei de cantar , é obra de gênio, de quem domina a arte poética até os últimos dias de sua vida.” (Inaldo Sampaio – JC caderno C 22/11/1996)
Deixei porque a idade
Já está muito avançada
A lembrança está cansada
E o som menos da metade
Perdi a felicidade
Que em moço eu possuía
Acabou-se a energia
Da máquina de fazer verso
Hoje vivo submerso
Num mar de melancolia
Minha amiga e companheira
Eu embrulhei num molambo
Pego nela por um bambo
Para tirar-lhe a poeira
Hoje não tem mais quem queira
Ir num canto me escutar
Fazer verso e gagueja
Topar no meio e no fim
Cantar feio, pouco e ruim
Será melhor não cantar.
Não foi por uma pensão
Que o governo me deu
Porque o eu do meu eu
Não me dá mais produção
Cantor sem inspiração
Tem vontade e nada faz
Afinal, sou um dos tais
Que ninguém quer assistir
Nem o povo quer ouvir
Nem eu também posso mais.
Por ocasião da morte de Pinto do Monteiro, o repentista Valdir Teles, fez este verso em homenagem ao velho cantador:
No momento em que Pinto faleceu
As violas pararam de tocar
Deus mandou o Nordeste se enlutar
Respeitando o valor do nome seu
Pernambuco ao saber entristeceu
Paraíba até hoje está doente
Só tem galo cantando atualmente
Porque Pinto mudou-se do poleiro
Com a morte de Pinto do Monteiro
Abalou-se o império do repente.
Eu comparo esta vida
à curva da letra S:
tem uma ponta que sobe
tem outra ponta que desce
e a volta que dá no meio
nem todo mundo conhece
Esta palavra saudade
conheço desde criança
saudade de amor ausente
não é saudade (é lembrança)
saudade só é saudade
quando morre a esperança
Aonde eu chego, não vi
Mal que não desapareça
Raposa que não se esconda
Bravo que não me obedeça
Letrado que não me escute
Cantor que não endoideça
Cantar com quem canta pouco
é viajar numa pista
com um carro faltando freios
o chofer faltando a vista
e um doido gritando dentro
atola o pé motorista
Minha corda não se estica
não se tora nem se enverga
da terra pro firmamento
meu pensamento se alberga
em um lugar tão distante
que lente nenhuma enxerga
Eu vou fazer uma casa
na Serra da Carnaíba
a frente pra Pernambuco
as costas pra Paraíba
só pra não ver duas coisas:
Nem Sumé, nem João Furiba
Há vários dias que ando,
Com o satanás na corcunda:
Pois, hoje, almocei na casa
Duma negra tão imunda,
Que a prensa de espremer queijo
Era as bochechas da bunda!
DIVERSAS ESTROFES DE CANTADORES
CANTADORES, REPENTISTAS E POETAS POPULARES
Livro de JOSÉ ALVES SOBRINHO, lançado em 26/07/2003, em João Pessoa – PB.
Belíssimas estrofes extraídas do LIVRO:
JOSÉ ALVES SOBRINHO
No nordeste brasileiro
da Bahia ao Maranhão,
do litoral ao sertão
encontram-se os violeiros
e os poetas folheteiros,
as mãos cheias de exemplares,
poemas, trovas, cantares
feitos por esses artistas:
Cantadores, Repentistas
e Poetas Populares.
LOURIVAL BATISTA
Um cientista profundo
perguntou-me certa vez,
se eu conhecia os três
desmantelos deste mundo.
Eu respondi num segundo:
DOIDO, MULHER E LADRÃO.
E disse mais a razão:
doido não tem paciência,
ladrão não tem consciência,
MULHER NÃO TEM CORAÇÃO.
SERRA BRANCA
Limeira meu negro velho,
você está em perigo:
um homem de sua idade,
quando vem cantar comigo,
só corta por onde eu risco,
só engole o que eu mastigo.
ZÉ LIMEIRA
Você cantando comigo,
o sacrifício é maior:
porque não canta improviso
nem sabe nada de cor,
quanto mais você se apura,
mais eu lhe acho pior.
ANTÔNIO NUNES DE SÁ
Vivo aqui, muito distante
da minha terra querida,
já vivi da minha vida
a parte mais importante,
porém como sou amante
das coisas do meu rincão,
guardo no meu coração
o que vi na mocidade.
Eu tenho muita saudade
do meu querido sertão.
OTÁVIO PINHEIRO FILHO
Teus olhos acastanhados,
tua boca angelical,
teu sorriso sensual
e teus lábios carminados,
teus cabelos ondulados,
tudo em perfeita harmonia,
tudo teu tem poesia
e me provoca o desejo
profundo de dar-te um beijo.
Deixa beijar-te Maria.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Brasil de caracaxá,
do quengo, do cacareco,
do fole, do reco-reco,
do pandeiro, do ganzá,
do chibé, do aluá,
baião de dois, rubacão,
da farofa, do pirão,
da tapioca de coco,...
Este é Brasil de caboco,
de mãe preta e pai João.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Cantando sempre vivi,
o cantar me dá prazer,
cantando hei de morrer,
porque chorando nasci,
chorando sempre perdi,
quero cantar até quando
Deus quiser, sempre sonhando,
sem gemer e sem chorar,
Cantando hei de encontrar
tudo que perdi chorando.
OTACÍLIO BATISTA
Somos três irmãos poetas,
três cantadores iguais,
no repente, na colcheia,
e em rimas colossais,
pode chegar cantador,
que nós três cantamos mais.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Vocês três são desiguais:
Dimas sé tem teoria,
Lourival é repentista,
porém não tem melodia,
você é melodioso,
mas tem pouca poesia.
JOÃO SILVEIRA
Hoje aqui se comemora
duas datas importantes:
Pai e filho neste dia
são aniversariantes,
nós precisamos saudar
os dois nataliciantes.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Dois aniversariantes,
em idades diferentes:
o pai está entre os adultos,
o filho entre os inocentes,
o pai mudando os cabelos,
o filho mudando os dentes.
CANHOTINHO
Sei que hei de morrer um dia
isto é que queira quer não,
mas sei que quando partir
os meus versos ficarão,
passando de boca em boca,
meu nome de mão em mão.
MANOEL GALDINO BANDEIRA
Manoel Galdino Bandeira
de São José de Piranha,
dá grito no pé da serra,
chega estremece a montanha,
cantador nas minhas unhas
ou corre ou morre ou apanha.
PINTO DE MONTEIRO
Eu como ando em companha,
no solo paraibano,
se eu pegar sua bandeira,
queimo a haste e rasgo o pano,
que o remendo menor,
pra costurar leva um ano.
JOÃO FURIBA
Pinto velho de Monteiro,
de anos tem quase cem,
viveu sem juntar dinheiro,
não vai deixar um vintém,
que o povo da terra dele
não dá a mão a ninguém.
PINTO DE MONTEIRO
Eu conheço muito bem
a sua taquaritinga:
em cima só tem lajedo
e embaixo é só caatinga,
em cima nunca choveu,
no pé da serra não pinga.
BIU GOMES
O sabiá do sertão
faz coisa que me comove:
passa três meses cantando
e sem cantar passa nove,
como que se preparando,
pra só cantar quando chove.
JÓ PATRIOTA
No jogo do improviso,
sou artista competente,
traço o baralho dos versos
e sei jogar meu repente,
no pife-pafe das rimas,
ninguém bate em minha frente.
MANOEL SOARES
Eu sou mais experiente
e você se desapruma,
trace o baralho das rimas,
que eu corto em cima, na ruma,
jogo com dois melés,
você não te nenhuma.
OLÍVIO JOSÉ DE OLIVEIRA
Sou o maior repentista
que pisa neste terreno,
pode chegar qualquer um,
rico, alvo ou moreno,
quando chega aqui é grande,
mas quando sai é pequeno.
PEDRO AMORIM
Todo cantador pequeno,
pensa que é grande e sabido:
sempre conta que venceu,
nunca diz que foi vencido,
acho que com meu colega,
isto tem acontecido.
CANTADOR NÃO IDENTIFICADO
ODILON, você está velho,
não tem mais sonoridade,
o pensamento já falha;
Um homem da sua idade
só serve pra duas coisas:
chorar e contar saudade.
ODILON NUNES DE SÁ
Admiro a mocidade
não querer envelhecer,
velho ninguém quer ficar,
moço ninguém quer morrer,
quem morre moço não vive,
bom e ser velho e viver.
SEBASTIÃO DA SILVA
A casa que morei nela,
que fui feliz com meus pais,
só restam teias de aranha,
cupim roendo os frechais,
é um poema de angústias,
de saudades,nada mais..
VALDIR TELES
Só restam mesmo os frechais
e a cumeeira pendida,
um fogão velho de lenha,
a mesa velha encardida,
mas pra mim foi a morada
melhor que eu tive na vida.
ARNALDO CIPRIANO DE SOUZA
Esta viola bonita,
que eu conduzo em minha frente,
do jeito que ela tem boca,
se tivesse língua e dente,
talvez contasse a metade
da dor que meu peito sente.
JOSÉ BERNARDINO DE OLIVEIRA
O que diz o cidadão,
nem mesmo um professor sabe,
mesmo este assunto não cabe
na minha compreensão,
não sei se antes de Adão,
esse negócio já vinha,
nem sei se antes já tinha,
ovo, galinha e poleiro,
não sei quem nasceu primeiro,
se avo, galo ou galinha.
BELARMINO DE FRANÇA
Andei a primeira vez,
de quatro pés e depois
comecei a andar de dois,
e hoje ando de três,
mas assim Deus não me fez,
não nasci desta maneira.
Uso este pé de madeira,
por uma necessidade;
oitenta e cinco de idade
não é boa brincadeira.
JOSÉ VILANOVA (Pai de Ivanildo Vilanova)
O vício da embriaguez
em meu feitio não mora,
por isso fico de fora,
deste sarau de vocês,
beber a primeira vez,
pra mim é coisa custosa,
vou tomar uma gasosa,
que nada de mal concebe,
aqui só glosa quem bebe,
quem não beber nada glosa.
OTACÍLIO BATISTA
Fazer o bem é perdido,
fazer o mal não convém,
entre a maldade e o bem,
quem faz o bem é traído.
Eu não fui compreendido,
quando tive compaixão
de quem me estendia a mão,
desejando ser feliz:
A quem mais favor eu fiz
Só me fez ingratidão.
MANOEL BELARMINO
No meu tempo de criança,
ou em casa ou no caminho,
quando encontrava um velhinho,
estranho ou da vizinhança,
com a voz humilde e mansa,
dizia “bênção seu Zé”,
e ele na boa fé
dizia: “Deus te abençoe”,
veja o passado o que foi,
veja o presente o que é.
JÓ PATRIOTA
Estes teus seios pulados,
que estão me desafiando,
são dois carvões faiscando,
no fogão dos meus pecados,
são dois punhais afiados,
que já ferem dois cristãos,
para o meus lábios pagãos,
são dois sapotis maduros,
Quero ver teus seios puros
nas conchas de minhas mãos.
SEVERINO PINTO
Vaqueiro é pra tirar couro,
espichar, fazer correia,
azeitar cabresto e peia,
tirar leite e beber soro,
visitar o logradouro,
curtir couro, fazer sola,
pra rabicho e rabichola,
ferrar gado e capar bode,
Quem é vaqueiro não pode
ser cantador de viola.
JOSÉ VICENTE
Só o presente me diz
tudo que fiz no passado,
caminho certo ou errado,
nas caminhadas que fiz,
só mesmo o destino quis
modificar minha mente,
o corpo velho e doente
mantém as rugas da cara.
A saudade não separa
o passado do presente.
JOSÉ ALVES DE MIRA-FLOR
Disse assim o tentador
com Jesus na solidão:
converte pedras em pão,
tentando a Nosso Senhor,
o Divino Salvador,
com frases que não se somem,
mostrou que os justos não comem,
repelindo o anjo audaz;
retira-te satanás,
Nem só de pão vive o homem.
MANOEL DODÔ
Na profissão de carreiro,
eu faço tudo e não deixo,
compro sebo ensebo o eixo,
a canga e o tamoeiro,
sete palmos de fueiro
medidos na minha mão,
uma vara de ferrão,
dois canzis de mororó:
carro de boi e forró
faz eu gostar do sertão.
ARNALDO CIPRIANO
A mulher do meu encanto
saiu comigo em passeio,
eu guiando um veraneio,
de uísque bebi um tanto,
chegando no Bel-recanto,
fomos dar ar no pneu,
a câmara de ar encheu,
no nono mês estourou:
Eu pequei, ela pecou,
mas o culpado fui eu.
Livro de JOSÉ ALVES SOBRINHO, lançado em 26/07/2003, em João Pessoa – PB.
Belíssimas estrofes extraídas do LIVRO:
JOSÉ ALVES SOBRINHO
No nordeste brasileiro
da Bahia ao Maranhão,
do litoral ao sertão
encontram-se os violeiros
e os poetas folheteiros,
as mãos cheias de exemplares,
poemas, trovas, cantares
feitos por esses artistas:
Cantadores, Repentistas
e Poetas Populares.
LOURIVAL BATISTA
Um cientista profundo
perguntou-me certa vez,
se eu conhecia os três
desmantelos deste mundo.
Eu respondi num segundo:
DOIDO, MULHER E LADRÃO.
E disse mais a razão:
doido não tem paciência,
ladrão não tem consciência,
MULHER NÃO TEM CORAÇÃO.
SERRA BRANCA
Limeira meu negro velho,
você está em perigo:
um homem de sua idade,
quando vem cantar comigo,
só corta por onde eu risco,
só engole o que eu mastigo.
ZÉ LIMEIRA
Você cantando comigo,
o sacrifício é maior:
porque não canta improviso
nem sabe nada de cor,
quanto mais você se apura,
mais eu lhe acho pior.
ANTÔNIO NUNES DE SÁ
Vivo aqui, muito distante
da minha terra querida,
já vivi da minha vida
a parte mais importante,
porém como sou amante
das coisas do meu rincão,
guardo no meu coração
o que vi na mocidade.
Eu tenho muita saudade
do meu querido sertão.
OTÁVIO PINHEIRO FILHO
Teus olhos acastanhados,
tua boca angelical,
teu sorriso sensual
e teus lábios carminados,
teus cabelos ondulados,
tudo em perfeita harmonia,
tudo teu tem poesia
e me provoca o desejo
profundo de dar-te um beijo.
Deixa beijar-te Maria.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Brasil de caracaxá,
do quengo, do cacareco,
do fole, do reco-reco,
do pandeiro, do ganzá,
do chibé, do aluá,
baião de dois, rubacão,
da farofa, do pirão,
da tapioca de coco,...
Este é Brasil de caboco,
de mãe preta e pai João.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Cantando sempre vivi,
o cantar me dá prazer,
cantando hei de morrer,
porque chorando nasci,
chorando sempre perdi,
quero cantar até quando
Deus quiser, sempre sonhando,
sem gemer e sem chorar,
Cantando hei de encontrar
tudo que perdi chorando.
OTACÍLIO BATISTA
Somos três irmãos poetas,
três cantadores iguais,
no repente, na colcheia,
e em rimas colossais,
pode chegar cantador,
que nós três cantamos mais.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Vocês três são desiguais:
Dimas sé tem teoria,
Lourival é repentista,
porém não tem melodia,
você é melodioso,
mas tem pouca poesia.
JOÃO SILVEIRA
Hoje aqui se comemora
duas datas importantes:
Pai e filho neste dia
são aniversariantes,
nós precisamos saudar
os dois nataliciantes.
JOSÉ ALVES SOBRINHO
Dois aniversariantes,
em idades diferentes:
o pai está entre os adultos,
o filho entre os inocentes,
o pai mudando os cabelos,
o filho mudando os dentes.
CANHOTINHO
Sei que hei de morrer um dia
isto é que queira quer não,
mas sei que quando partir
os meus versos ficarão,
passando de boca em boca,
meu nome de mão em mão.
MANOEL GALDINO BANDEIRA
Manoel Galdino Bandeira
de São José de Piranha,
dá grito no pé da serra,
chega estremece a montanha,
cantador nas minhas unhas
ou corre ou morre ou apanha.
PINTO DE MONTEIRO
Eu como ando em companha,
no solo paraibano,
se eu pegar sua bandeira,
queimo a haste e rasgo o pano,
que o remendo menor,
pra costurar leva um ano.
JOÃO FURIBA
Pinto velho de Monteiro,
de anos tem quase cem,
viveu sem juntar dinheiro,
não vai deixar um vintém,
que o povo da terra dele
não dá a mão a ninguém.
PINTO DE MONTEIRO
Eu conheço muito bem
a sua taquaritinga:
em cima só tem lajedo
e embaixo é só caatinga,
em cima nunca choveu,
no pé da serra não pinga.
BIU GOMES
O sabiá do sertão
faz coisa que me comove:
passa três meses cantando
e sem cantar passa nove,
como que se preparando,
pra só cantar quando chove.
JÓ PATRIOTA
No jogo do improviso,
sou artista competente,
traço o baralho dos versos
e sei jogar meu repente,
no pife-pafe das rimas,
ninguém bate em minha frente.
MANOEL SOARES
Eu sou mais experiente
e você se desapruma,
trace o baralho das rimas,
que eu corto em cima, na ruma,
jogo com dois melés,
você não te nenhuma.
OLÍVIO JOSÉ DE OLIVEIRA
Sou o maior repentista
que pisa neste terreno,
pode chegar qualquer um,
rico, alvo ou moreno,
quando chega aqui é grande,
mas quando sai é pequeno.
PEDRO AMORIM
Todo cantador pequeno,
pensa que é grande e sabido:
sempre conta que venceu,
nunca diz que foi vencido,
acho que com meu colega,
isto tem acontecido.
CANTADOR NÃO IDENTIFICADO
ODILON, você está velho,
não tem mais sonoridade,
o pensamento já falha;
Um homem da sua idade
só serve pra duas coisas:
chorar e contar saudade.
ODILON NUNES DE SÁ
Admiro a mocidade
não querer envelhecer,
velho ninguém quer ficar,
moço ninguém quer morrer,
quem morre moço não vive,
bom e ser velho e viver.
SEBASTIÃO DA SILVA
A casa que morei nela,
que fui feliz com meus pais,
só restam teias de aranha,
cupim roendo os frechais,
é um poema de angústias,
de saudades,nada mais..
VALDIR TELES
Só restam mesmo os frechais
e a cumeeira pendida,
um fogão velho de lenha,
a mesa velha encardida,
mas pra mim foi a morada
melhor que eu tive na vida.
ARNALDO CIPRIANO DE SOUZA
Esta viola bonita,
que eu conduzo em minha frente,
do jeito que ela tem boca,
se tivesse língua e dente,
talvez contasse a metade
da dor que meu peito sente.
JOSÉ BERNARDINO DE OLIVEIRA
O que diz o cidadão,
nem mesmo um professor sabe,
mesmo este assunto não cabe
na minha compreensão,
não sei se antes de Adão,
esse negócio já vinha,
nem sei se antes já tinha,
ovo, galinha e poleiro,
não sei quem nasceu primeiro,
se avo, galo ou galinha.
BELARMINO DE FRANÇA
Andei a primeira vez,
de quatro pés e depois
comecei a andar de dois,
e hoje ando de três,
mas assim Deus não me fez,
não nasci desta maneira.
Uso este pé de madeira,
por uma necessidade;
oitenta e cinco de idade
não é boa brincadeira.
JOSÉ VILANOVA (Pai de Ivanildo Vilanova)
O vício da embriaguez
em meu feitio não mora,
por isso fico de fora,
deste sarau de vocês,
beber a primeira vez,
pra mim é coisa custosa,
vou tomar uma gasosa,
que nada de mal concebe,
aqui só glosa quem bebe,
quem não beber nada glosa.
OTACÍLIO BATISTA
Fazer o bem é perdido,
fazer o mal não convém,
entre a maldade e o bem,
quem faz o bem é traído.
Eu não fui compreendido,
quando tive compaixão
de quem me estendia a mão,
desejando ser feliz:
A quem mais favor eu fiz
Só me fez ingratidão.
MANOEL BELARMINO
No meu tempo de criança,
ou em casa ou no caminho,
quando encontrava um velhinho,
estranho ou da vizinhança,
com a voz humilde e mansa,
dizia “bênção seu Zé”,
e ele na boa fé
dizia: “Deus te abençoe”,
veja o passado o que foi,
veja o presente o que é.
JÓ PATRIOTA
Estes teus seios pulados,
que estão me desafiando,
são dois carvões faiscando,
no fogão dos meus pecados,
são dois punhais afiados,
que já ferem dois cristãos,
para o meus lábios pagãos,
são dois sapotis maduros,
Quero ver teus seios puros
nas conchas de minhas mãos.
SEVERINO PINTO
Vaqueiro é pra tirar couro,
espichar, fazer correia,
azeitar cabresto e peia,
tirar leite e beber soro,
visitar o logradouro,
curtir couro, fazer sola,
pra rabicho e rabichola,
ferrar gado e capar bode,
Quem é vaqueiro não pode
ser cantador de viola.
JOSÉ VICENTE
Só o presente me diz
tudo que fiz no passado,
caminho certo ou errado,
nas caminhadas que fiz,
só mesmo o destino quis
modificar minha mente,
o corpo velho e doente
mantém as rugas da cara.
A saudade não separa
o passado do presente.
JOSÉ ALVES DE MIRA-FLOR
Disse assim o tentador
com Jesus na solidão:
converte pedras em pão,
tentando a Nosso Senhor,
o Divino Salvador,
com frases que não se somem,
mostrou que os justos não comem,
repelindo o anjo audaz;
retira-te satanás,
Nem só de pão vive o homem.
MANOEL DODÔ
Na profissão de carreiro,
eu faço tudo e não deixo,
compro sebo ensebo o eixo,
a canga e o tamoeiro,
sete palmos de fueiro
medidos na minha mão,
uma vara de ferrão,
dois canzis de mororó:
carro de boi e forró
faz eu gostar do sertão.
ARNALDO CIPRIANO
A mulher do meu encanto
saiu comigo em passeio,
eu guiando um veraneio,
de uísque bebi um tanto,
chegando no Bel-recanto,
fomos dar ar no pneu,
a câmara de ar encheu,
no nono mês estourou:
Eu pequei, ela pecou,
mas o culpado fui eu.
sábado, 28 de agosto de 2010
OTACÍLIO BATISTA
OTACÍLO BATISTA PATRIOTA (* 26/09/1923 + 05/08/2003), o gigante do improviso, a voz do uirapuru, era natural de Itapetim - PE, região do Pajeú das Flores, descendente da família tradicional de poetas e cantadores do nordeste brasileiro, NUNES e BATISTA, irmão de LOURIVAL e DIMAS, já falecidos. Residia em João Pessoa – PB há 35 anos.
Cantou para os presidentes da república: Eurico Dutra, Juscelino Kubitschek, João Goulart e Jânio Quadros, e para o Papa João Paulo II, Roberto Carlos e Pelé.
Autor da letra da consagrada música MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA FAZ O HOMEM GEMER SEM SENTIR DOR, gravada e cantada por Amelinha, Zé Ramalho, Bia Marinho e outros intérpretes.
É autor dos seguintes LIVROS:
· Poemas e canções;
· Antologia ilustrada dos cantadores (em parceria com Francisco F. Linhares, do ceará);
· Ria até cair de costas;
· Poemas que o povo pede;
· A criança abandonada e outros poemas;
· Os versos apimentados do velho João Mandioca;
· O caçador de veado;
· O que é que me falta fazer mais?
· Entre outros.
CORDÉIS:
· Zé Limeira – Poeta dos Disparates;
· Peleja de Zé Limeira com João Mandioca;
· Zé Américo em versos;
· O valor que o chifre tem;
· Versos à Câmara Cascudo;
· Apelo ao Papa;
· Peleja de Otacílio Batista com Zé Ramalho;
· Dr. Alisando Cresce;
· Os bichos contra a ciência;
· O namoro de hoje em dia;
· Peleja de Pelé com Pedro I;
· A morte de Padre Zé;
· E outros.
DISCOS:
· Otacílio e Dimas batista;
· Cantador, verso e viola;
· Viola, verso e viola;
· Repentistas – os gigantes do improviso;
· Apelo ao papa;
. O Papa e o Jegue;
· Otacílio Batista do Pajeú;
· Só Deus improvisa mais;
· MEC Secretaria de Cultura;
· Gigantes do improviso;
· Meio século de viola;
· E outros.
PARTICIPAÇÕES ESPECIAIS:
· MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA;
· COLETÂNEA DE REPENTISTAS e outros livros;
· Canção: Lua divina – Gravada por Oliveira de Panelas;
· NORDESTE: CORDEL, REPENTE;
· Canção: gado bom quem tem sou eu.
VIOLAS DE LUTO
Lourinaldo Vitorino –Poeta repentista, em 06/08/2003
As violas de luto soluçando
Dão adeus ao Bocage do repente,
Um fenômeno de arte, um expoente,
Que de cinco a seis décadas improvisando
Sua voz de trovão saiu rasgando
Modulando a palavra em cada nota
Pra cultura um nocaute, uma derrota,
Um desastre, uma perda, um golpe horrendo,
Enlutado o repente está perdendo
OTACÍLIO BATISTA PATRIOTA.
Para a arte esse gênio é o auxílio
Que Deus deu de presente a todos nós
Seu baião sonoroso e sua voz
Soam agora no túmulo de Hercílio,
Com certeza a figura de OTACÍLIO
Nesse instante viaja em cada mente
Num cordel de estrelas reluzente
Com seu porte de oficial romano
Qual a John Wayne no Oeste americano
Firme, austero, implacável e surpreendente.
Na arena do verso improvisado
OTACÍLIO passou por toda a prova
Enfrentou Zé Faustino Vilanova,
A caneta estratégica do passado,
Quando Pinto se impôs, foi consagrado,
Duelando com Dimas e Hercílio
A viola era o único utensílio
Que usava no palco esse gigante
Seu revólver era o verso fulminante
Que impunha a grandeza de OTACÍLIO.
O repente sem OTACÍLIO chora,
As viloas de luto cantam e tremem,
As sextilhas satíricas clamam e gemem,
Os sertões no silêncio nesta hora
Ouvem o povo que angustiado implora,
Que Deus abra o portão do céu divino,
E que São Pedro soluce e toque o sino
Que a terra chorando viu perder
Um brilhante, importante ser,
Condutor do repente nordestino.
BRÁULIO TAVARES
Numa nuvem do Céu que tem escrito
“Botequim da Poesia Brasileira”,
OTACÍLIO chegou, puxou cadeira,
e encostou na parede do Infinito.
Na platéia se ouvia palma e grito,
vi até JESUS CRISTO assobiando,
OTACÍLIO, a viola ponteando,
se juntou ao baião de LOURO e DIMAS,
num dilúvio de glosas e de rimas...
A trindade no Céu está cantando.
Estrofes de OTACÍLIO BATISTA
Seis Poetas geniais
honram da poesia o manto,
seis estrelas divinais,
que o mundo admira tanto:
Dante, Camões e Virgílio,
Louro, Dimas e Otacílio,
NÃO MORREM, MUDAM DE CANTO.
Este livro dedicado
aos três irmãos cantadores,
foi por Deus abençoado
lá no Pajeú das Flores,
numa pequena cidade,
berço da imortalidade,
de uma beleza sem fim,
dos poetas sonhadores,
naturais de Itapetim,
do mais puro domicílio,
LOURO, DIMAS e OTACÍLIO.
MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA FAZ O HOMEM GEMER SEM SENTIR DOR
Numa luta de gregos e troianos
Por Helena, mulher de Menelau,
Diz a História que um cavalo de pau
Acabava uma guerra de dez anos....
Menelau, o maior dos espartanos,
Venceu Páris, o grande sedutor,
Humilhando a família de Heitor,
Em defesa da honra caprichosa.
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Alexandre, figura desumana,
Fundador da famosa Alexandria,
Conquistava, na Grécia e destruía
Quase toda a população tebana.....
A beleza atrativa de Roxana
Dominava o maior conquistador;
E depois de vencê-la, o vencedor
Entregou-se à pagã mais que formosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
A mulher tem, na face, dois brilhantes
Condutores fiéis do seu destino;
Quem não ama o sorriso feminino,
Desconhece a poesia de Cervantes,
A coragem dos grandes navegantes
Enfrentando a procela em seu furor.
Se não fosse a mulher, mimosa flor,
A história seria mentirosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Virgolino Ferreira, o Lampião
Bandoleiro das selvas nordestinas,
Sem temer o perigo nem ruínas,
Foi o rei do cangaço no sertão;
Mas, um dia, sentiu, no coração,
O feitiço atrativo do amor:
A mulata da terra do condor
Conquistava uma fera perigosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Na velhice o sujeito nada faz,
a não ser uma igreja que visita,
mas se acaso encontrar mulher bonita,
ele troca Jesus por satanás...
pensa logo no tempo de rapaz,
diz pra ela me ame por favor,
a resposta que vem é não senhor,
sua idade passou, deixe de prosa!
Mulher nova bonita e carinhosa
faz o homem gemer se sentir dor.
LUA DIVINA
Lua divina, peregrina e feiticeira,
tão brasileira como não tem outra igual,
angelical pela sua formosura
e noiva pura dos poetas do sertão,
não tenho lar nem esposas nem carinho,
nem um filhinho a quem dê meu coração,
e por viver sem prazer e tão sozinho
a ti ó lua dediquei essa canção.
APELO AO PAPA
Fiz da santa poesia a mensageira
Da pobreza mais pobre do país,
É pequeno o poeta que não diz
Quando sofre a criança brasileira
Ninguém pode viver dessa maneira
Sem um teto, sem lar, sem pão, sem nome:
Quem é filho de rico bebe e come,
Quem é filho de pobre não escapa,
As crianças sem papa pedem ao PAPA
Santo Papa dê papa a quem tem fome.
O POETA
A virtude é o caminho do amor,
sem o amor deste mundo, o que seria?
A matéria sem luz não tem valor;
ninguém vive sem Deus em companhia...
a poesia é o jardim do Criador,
o jardim do poeta é a poesia.
O POETA E O PASSARINHO
O poeta e o passarinho
são ricos de inteligência
simples como a natureza
eternos como a ciência
estrelas da liberdade
peregrinos da inocência.
Herdeiros da providência,
um no chão, outro voando,
UM PENA COM TANTA PENA,
OUTRO SEM PENA PENANDO,
UM CANTA CHEIO DE PENA,
OUTRO SEM PENA CANTANDO.
O poeta sofre quando
vê um pobre passarinho
nas grades de uma gaiola
sem ter direito a seu ninho
são iguais no sofrimento
o poeta e o passarinho.
O poeta afina o pinho
no viveiro da garganta
o passarinho poeta
por entre as folhas da planta
sem viola metro e rima
só Deus sabe o que ele canta.
Do poeta a musa é santa
santa musa da poesia
passarinho canta e voa
no espaço rodopia
faz ziguezigue no corpo
brincando com a ventania.
Ao romper de um novo dia
o passarinho gorjeia
canta o poeta a saudade
no clarão da lua cheia
faz da viola um piano
da garganta uma sereia.
O poeta traz na veia
os segredos do além
quando canta de improviso
não pergunta de onde vem
o poeta e o passarinho
não sabem o valor que tem.
O poeta vive sem
ódio, maldade e rancor,
ainda sendo traído
perdoa o seu traidor,
canta alegre o passarinho
sublimes canções de amor.
O poeta e o beija-flor
ambos vivem sem ciúme
um que canta, outro que voa
da planície ao alto cume,
um de versos perfumado
outro colhendo o perfume.
Nas camadas do verdume
o passarinho vegeta
não disse nem a metade
dessa dupla tão completa,
do poeta ser humano
do passarinho poeta.
NÃO OFENDA A NATUREZA
Não ofenda a natureza,
inocente e sem maldade,
a dona do pão d mesa,
coração da humanidade.
Em nome da consciência,
deixa a natureza em paz,
verde fonte da inocência,
mãe de todos os mortais.
...........
Apelo para vocês,
em nome de quem não erra,
vamos salvar dessa vez
o organismo da terra:
mares, rios, cataratas,
serras, colinas e matas,...
toda essa imensa grandeza,
pouca gente compreende
que a vida humana depende
do pulmão da natureza.
COISAS DO SERTÃO
Ao romper da madrugada,
um vento manso desliza,
mis tarde ao sopro d brisa,
sai voando a passarada.
Uma tocha avermelhada
aparece lentamente,
na janela do nascente,
saudando o romper da aurora,
no sertão que a gente mora
mora o coração da gente.
O cantador violeiro
longe da terra querida,
sente um vazio na vida,
tornando prisioneiro,
olha o pinho companheiro,
aí começa a tocar,
tem vontade de cantar,
mas lhe falta inspiração.
Que a saudade do sertão
faz o poeta chorar.
ROSINA
Mãe, perfeita e carinhosa,
de amor e dedicação,
aos onze filhos que teve,
não faltou água nem pão,
antes quem vivia só,
é hoje, mãe e avó,
da mais bonita união,
aos onze filhos completos
e aos seus quatorze netos
entregou seu coração.
O CORPO DA MULHER NUA
A mulher com a natureza
nasceram com a mesma sina,
sem elas o pão da mesa
nos lares se contamina.
A roupa esconde a beleza
da beleza feminina.
Não há planta que floresça
quando a seca não recua,
não há poeta que cresça
jogando pedras na lua,
nem há roupa que mereça
o corpo da mulher nua.
João Pessoa tem razão,
Os seus filhos têm valores,
O Estado além de culto
De famosos escritores,
é amigo da cultura,
berço da literatura
e Centro dos cantadores.
Quando pego na viola
nesta viola querida,
eu me sinto noutro mundo,
numa existência florida,
vão-se todas as tristezas,
todas as mágoas da vida.
Velho, caduco e doente,
cambaleando na rua,
diante de mulher nua,
nem dor de cabeça sente.
O passarinho inocente
abre as asas do passado,
ergue o pescoço furado,
mergulha naquela planta.
Mulher pelada levanta
salário de aposentado.
ROJÃO PERNAMBUCANO
Certa vez fui convidado
Para dançar numa festa
Perto de Nova Floresta
Na Vila do Pau Inchado
Eita forró animado:
Chega a poeira cobria
Mas a mulher que eu queria
Do Pau não se aproximava
Quando eu ia ela voltava
Quando eu voltava ela ia.
A garota Manuela
Quis viver só de um negócio
Entrava sócio e mais sócio
Dentro do negócio dela
Eu fui lá falar com ela
Mostrando o que possuía:
Ela somava e media
Meu negócio não entrava
Quando eu ia ela voltava
Quando eu voltava ela ia.
“Segue OTACÍLIO a corrente,
poeta por excelência,
dotado da providência,
inspirado no repente,
vive na linha da frente,
como bom compositor,
formado sem ser doutor,
Deus lhe deu o dom de ser
repentista até morrer,
Poeta, Artista e Escritor.
(Estrofe de Anísio Lira)”.
O VALOR QUE O PEIDO TEM
(Otacílio Batista Patriota)
O peido é bom toda hora
Sem peido não há quem passe
A criança quando nasce
Tanto peida como chora
Um peido ao romper da aurora
Eu não troco por ninguém
Há noites que eu solto cem
Peidos grandes e pequenos
Já conheço mais ou menos
O valor que o peido tem
Um velho já moribundo
Nas agonias da morte
Soltou um peido tão forte
Que se ouviu no outro mundo
O peido gritou no fundo
Que só apito de trem
O velho sentiu-se bem
Levantou-se no outro dia
Dizendo a quem não sabia
O valor que o peido tem
Pela porta do bufante
Para não morrer de volvo
Diariamente eu devolvo
Peido grande a todo instante
O sujeito ignorante
Não me compreende bem
Fecha a porta do sedem
Deixa o peido apodrecer
Esse morre sem saber
O valor que o peido tem
Um peido silencioso
Por baixo de um cobertor
É tão grande o seu valor
Que descrevê-lo é custoso
Cheira mais que o mais cheiroso
Vale de Jerusalém
As roseiras de Siquem
As savanas do Saara
Nada disso se compara
O valor que o peido tem
Ofende muito a pressão
peido grande encarcerado
Deixa o corpo aliviado
Depois que sai da prisão
As veias do coração
Controlam-se muito bem
Sente o coração também
Uma alegria sem par
Ninguém sabe calcular
O valor que o peido tem
Uma dor que faz mudar
A cadencia dos ouvidos
São os peidos recolhidos
Que você não quis soltar
Não vá se... prejudicar
Em respeito a seu ninguém
O velho Matusalém
Quase mil anos viveu
Porque toda vida deu
O valor que o peido tem
Um negro foi se casar
Ou se casava ou morria
Peidou tanto neste dia
Quase derruba o altar
A noiva foi reclamar
Findou peidando também
O padre disse meu bem
Ninguém dar mais do que eu
O valor que o peido tem
Peido azedo de água soda
Fede a casca de limão
E de jabá com feijão
Passa folgado na roda
Peido nenhum se encomoda
Com censuras de ninguém
Presta um favor quando vem
Aliviar quem padece
É quando a gente conhece
O valor que o peido tem
Peido fedendo a chulé
Num samba de madrugada
Sai com tanta misturada
Que ninguém sabe o que é
Mais um peido de Pelé
Jogador que vive bem
Passa veloz no vintém
Não há goleiro que pegue
Nenhum bom juiz que negue
O valor que o peido tem
Que prazer eu não teria
Se um peido se apresentasse
Bem fedorento e peidasse
Deixando a fotografia
Mas o peido não confia
Nos olhos de seu ninguém
São mistérios do além
Não posso compreender
Mas vale a pena saber
O valor que o peido tem
Um peido em pleno verão
Cheirando a cu de veado
Tava sendo arrematado
Numa festa de leilão
Quando chegou num milhão
Não quis mais gritar ninguém
Naquilo o prefeito vem
Dizendo a honra me cabe
Minha prefeitura sabe
O valor que o peido tem
Dizia o velho Abranhão
Para seu neto Isau
O peido agradece ao cu
Depois que sai da prisão,
Peidava um tal de Sansão
Pelado, e cego de guia
Temendo a onda bravia
Moisés peidou no oceano
E o papa no Vaticano
Só peida uma vez por dia
Alguém disse que Jacó
Quando casou com Raquel
Passou a lua de mel
Peidando de fazer dó
Esse parente de ló
Era genro de Labão,
Davi, pai de Salomão
Poeta, Rei e pastor
Peidava fazendo amor
Na cama fria do chão.
O homem velho esmorece
Assim que a noite aparece
Se deita e faz uma prece
Lá num canto da parede,
Meia noite se levanta
Com secura na garganta
Pega um caneco de frande
Vai ao pote mata a sede
Solta quatro peido grande
Volta cegado prá rede.
Peido fino é safadeza
Peido alto é cretinice
Peido suave é meiguice
Peido baixo o é sutileza
Silencioso é firmeza
Peido brando indica paz
O grosso é dos anormais
Sempre indica frouxidão
Mas chegando a perfeição
O homem não peida mais.
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Uma notícia dos poetas:
FRANCISCO LINHARES:
Conheci Linhares por apresentação do meu compadre, dentista e advogado, José Wilson Sales, mais ou menos à época da publicação da Antologia Ilustrada dos Cantadores. Estou com o volume em mãos, uma 2ª Edição, Universidade Federal do Ceará, 1982. Acho que havia eu adquirido a primeira edição, de 1976, também pela UFC. Contudo, sou um fino "perdedor" de livros, do que muito me orgulho, a espalhá-los com os amigos. (Clique na figura ao lado para conhecer a Biblioteca Cururu, um manifesto anti-estantes). Meu interesse pela literatura era, então, quase nenhum. Mesmo assim conversamos sobre Zé-Limeira (Orlando Tejo), e amenidades gerais. Um velhote muito simpático e distinto, assim me pareceu o Francisco Linhares. Vou digitar aqui no Jornal de Poesia o que dele eu for encontrando. Quem sabe um contacto com a família, e surjam mais coisas. Os leitores bem que podem ajudar: fotos, ensaios, outros escritos. Ele me disse que não era um cantador, um violeiro; pesquisador somente. E que pesquisador!, digo-lhes eu.
OTACÍLIO BATISTA
Não conheci pessoalmente. O cabra é dos bons, aliás, ótimo. A batistada inteira, são vários irmãos, todos poetas da melhor estirpe. Clique aqui para a página dele.
A ANTOLOGIA propriamente dita:
É o livro que eu gostaria de mandar reeditar para distribuir gratuito com os amigos, bibliotecas, faculdades de letras e professoras de literatura da lusofonia. Obra definitiva, quase 500 páginas, abordando o campo teórico do Cordel e trazendo as mais belas e presepeiras cantorias deste sertão Brasil. O pior é nos darmos conta da importância teórica do Cordel, de par com o mais absoluto desconhecimento da maior parte dos versejadores do asfalto. Como não posso publicar a obra inteira, em respeito aos direitos autorais, colocarei aqui apenas a parte teórica:
Sextilha
Sete linhas ou sete pés
Moirões
Moirão de sete pés
Moirão trocado
Moirão que você cai
Moirão voltado
Décima
Martelo agalopado
Galope a beira-mar
Parcela
Quadrões
Quadrão trocado
Gabinete
Toada alagoana
Meia quadra
Dez pés de queixo caído
Gemedeira
Quadra
Quadra simples
Quadra oposta
Quadra cruzada
Quadra persa
Variante da quadra persa
Ligeira
Gêneros da Poesia Popular
[Teoria do Cordel]
in
Antologia Ilustrada dos
Cantadores
de
Francisco Linhares
&
Otacílio Batista
2ª Ed. UFC, págs. 23/39
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Entre as criações dos poetas clássicos, que vieram a ser usadas pelos nossos cantadores, estão a Quadra, a Décima, a Sextilha em decassílabo com rimas cruzadas, e sua variante.
A Sextilha com rimas cruzadas originou-se da Oitava de Ariosto, estilo que Sá de Miranda (irmão de Mem de Sá), introduziu em Portugal, no século XVI, e que possibilitou a Camões realizar sua imortal obra "Os Lusíadas".
Contando-se com os gêneros mais usados, com os de pouca utilização, ou com os que se encontram completamente abandonados para o improviso, a "Poesia Popular" possui trinta e seis modalidades, número verdadeiramente espantoso, que vem, através dos tempos, demonstrar o grande poder criativo dos nossos bardos
matutos.
Até à época da famosa peleja de Francisco Romano Caluete com Inácio da Catingueira, o estilo preferido pelos cantadores era a Quadra. Após isso, apareceu a Sextilha, pertencente à família dos setessílabos, modalidade essa usada, não só nos grandes debates, mas, também, na abertura de qualquer programa de viola. "É a Deusa inspiradora dos poetas repentistas". Faremos, a seguir, um estudo dos principais gêneros usados pelos nossos violeiros.
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1. - Sextilha:
Talvez, por ser mais fácil, seja o gênero preferido pelos nossos repentistas, principalmente no início das apresentações. A Sextilha é uma estrofe com rimas deslocadas, constituída de seis linhas, seis pés ou de seis versos de sete sílabas, nomes que têm a mesma significação. Na Sextilha, rimam as linhas pares entre si, conservando as demais em versos brancos. Leandro Gomes de Barros, grande escritor da Literatura de Cordel, filho de Pombal, Estado da Paraíba, escreveu:
Meus versos inda são do tempo
Que as coisas eram de graça:
Pano medido por vara,
Terra medida por braça,
E um cabelo da barba
Era uma letra na praça.
Outro exemplo que daremos é o do ceguinho anônimo, que, após a morte de sua desventurada mãe e guia, chorou, com os olhos d'alma, seu infortúnio:
Já tive muito prazer,
Hoje só tenho agonia!
Não sinto porque sou cego,
Eu sinto é falta do guia!
Quando mamãe era viva,
Eu era um cego que via!
Ou, ainda, a de Francisco Pequeno, repentista paraibano, nesta inteligente análise:
Uma morrinha no gado
É derrota em fazendeiro,
E um cavalo ruim
derrota dum vaqueiro!
A derrota do país
É dever no estrangeiro!
2. - Sete Linhas ou Sete Pés
No início do século atual, o Cantador alagoano Manoel Leopoldino de Mendonça Serrador fez uma adaptação à Sextilha, criando o estilo de sete versos, também chamado de sete linhas ou de sete pés, rimando os versos pares até o quarto, como na Sextilha; o quinto rima com o sexto, e o sétimo com o segundo e o quarto. Exemplifiquemos com o próprio criador do gênero:
Amigo José Gonçalves,
Amanhã cedinho, vá
A Coatis, onde reside
Compadre João Pirauá;
Diga a ele dessa vez,
Que amanhã das seis a seis,
Deus querendo, eu chego lá!
José Duda do Zumbi (Manoel Galdino da Silva Duda), no ocaso da vida, com a experiência da idade, disse para José Miguel, jovem companheiro, com quem duelava:
Fui moço, hoje estou velho!
Pois o tempo tudo muda!
Já fui um dos cantadores
Chamado Deus nos acuda ...
Este que estão vendo aqui
Foi Zé Duda do Zumbi!
Hoje Zumbi do Zé Duda!
3. - Moirões:
Dentro da contextura da Poesia Popular, o Moirão tem sido o gênero a sofrer grandes variações ao longo do tempo. "É uma modalidade, onde os cantadores se revezam dentro da mesma estrofe. No século passado, o Moirão em quintilha substituiu o Moirão de seis versos, ambos em desuso. No Moirão de seis linhas, um Cantador fazia dois versos, o outro intercalava com dois, e o iniciante fechava a estrofe. Vejamos um Moirão de seis linhas, cantado por Romano e Inácio:
I Seu Romano, estão dizendo
Que nós não cantamos bem!
R Pra cantar igual a nós,
Aqui, não vejo ninguém!
I E o diabo que disse isto
É o pior que aqui tem!
No Moirão de cinco versos, que veio depois do de seis, havia um revezamento dos cantadores, nas duas linhas iniciais da estrofe, cabendo ao primeiro os três últimos versos para o fechamento da estância. Do encontro entre os paraibanos Romano Elias da Paz e Francisco Pequeno, colheu-se:
F.P. No Mourão não deixo nó!
R.E. O meu eu lavro de enxó!
F.P. Colega, estou pesaroso ...
No recinto primoroso,
Sei que fico a cantar só!
4. Moirão de sete pés:
O Moirão de sete pés é o mais usado atualmente. Formado por uma estrofe de sete linhas, cabendo, ao iniciante, a formação de cinco versos, isto é, os dois primeiros e os três finais; enquanto a cargo do segundo cantador ficam os versos de ordem três e quatro. Os pernambucanos Agostinho Lopes dos Santos e José
Bernardino de Oliveira assim iniciam um duelo:
A.L. Não vã você achar ruim
Este Mourão a doer!
J.B. Eu acredito, Agostinho
Naquilo que posso ver!
A.L. Companheiro, não se gabe,
Que a pessoa que não sabe,
Agrava a Deus sem querer!
Esse gênero pode ser cantado por três violeiros. Pedra Azul inicia:
Vou dar começo à questão
Pra ver quem ganha no fim!
Canhotinho, referindo-se a Severino Pinto, que tomava parte da porfia, foi mais agressivo:
Eu morro e não tenho medo
Dum Pinto pelado assim!
Pinto, que não perdoa, finalizou violento:
Sou pelado, sem canhão,
Por causa de um beliscão
Que tua mãe deu em mim!
5 - Moirão trocado:
A diferença deste gênero para o anterior está exclusivamente no aparecimento de palavras que se alternam nas quatro primeiras linhas da estância. Lourival Batista e Severino Pinto dão uma demonstração deste estilo:
L. Eu, da graça, faço o riso,
E, do riso, faço a graça!
P. E da massa, faço o pão,
E do pão, eu faço a massa!
L. Você desgraçou a peça:
Que u'a misturada dessa
Não há padeiro que faça!
6 - Moirão que você cai:
É um gênero muito apreciado, com versos de sete sílabas, como nos demais, onde as estrofes aparecem com doze linhas, havendo quatro versos comuns a elas: terceiro, sexto, nono e décimo segundo. O iniciante é responsável pela formação dos versos: primeiro, segundo, terceiro, sétimo, oitavo, décimo, décimo primeiro e
décimo segundo. Ficando os demais a cargo do parceiro intercalante. Apreciemos, com Lourival e Otacílio, um Moirão que você cai:
L. Meu irmão, a hora é esta,
De travar-se um desafio!
Lá vai uma, duas e três ...
O. Mas, em luta eu não confio
Porque desanima a festa!
Lá vai quatro, cinco e seis ...
L. Meus versos ninguém detesta
Porque desafio distrai!
O. Cuidado que você cai...
L. Caio tomando sorvete,
Você levando cacete,
Se for por dez pés lá vai!
7 - Moirão voltado:
Gênero relativamente novo, com estrofe de treze versos de sete sílabas, em que os preliantes vão se alternando até a oitava linha, para, em seguida, unirem suas vozes, como em coro, neste estribilho:
Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
Em seguida, repetem a oitava linha com o estribilho acima. Para melhor compreensão, imaginemos os cantadores A e B:
A. Tudo, neste mundo, volta.
B. Com você, combino eu!
A. Volta o rico e o plebeu;
B. Volta quem prende e quem solta ...
A. Volta a paz e a revolta;
B. Volta o sim e volta o não!
A. Volta até Napoleão
B. Que há tempo está sepultado...
A/B Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
Que há tempo está sepultado...
Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
8 - Décima:
Embora de origem clássica, é a Décima um estilo muito apreciado, desde os primórdios da Poesia Popular, principalmente por ser o gênero escolhido para os motes, onde os cantadores fecham cada estrofe com os versos da sentença dada, passando a estância a receber a denominação de glosa. Como o próprio nome diz, Décima é uma estrofe ou estância de dez versos de sete sílabas, assim distribuídos: o primeiro, rima com o quarto e o quinto; o segundo, com o terceiro; o sexto, com o sétimo e o décimo, e o oitavo, com o nono. De Antônio Ugolino Nunes da Costa (Ugolino do Sabugi), primeiro grande Cantador brasileiro, extraímos duas estrofes, em Décima, de seu famoso poema "As obras da Natureza":
As obras da Natureza
São de tanta perfeição,
Que a nossa imaginação
Não pinta tanta grandeza!
Para imitar a beleza
Das nuvens com suas cores,
Se desmanchando em louvores
De um manto adamascado,
O artista, com cuidado,
Da arte, aplica os primores.
Brilham, nos prados, verdumes
De um tapete aveludado;
Brilha o rochedo escarlado,
Das penhas seus altos cumes;
Os montes formam tais gumes,
Que a gente, os observando,
Vê como que se alongando,
Sumir-se na imensidade...
Nossa visibilidade
os perde se está olhando.
O mote é uma sentença ou pensamento, formado de um ou dois versos, com que se finalizam as estrofes. Os primeiros motes eram dados em Quadra, ficando o poeta obrigado a improvisar quatro Décimas, contendo cada uma, pela ordem, um verso ou linha da Quadra. Com a evolução, o mote passou de quatro versos para dois, e, mais raramente, usa-se o de um verso. O mote de duas linhas pode-se apresentar de duas maneiras. Na primeira, já em desuso, a quarta linha da estrofe é formada pelo primeiro verso do mote e a décima pelo segundo. Exemplifiquemos com o mote dado pelo Dr. Raimundo Asfora, descendente de árabe, ao companheiro Otacílio Batista:
Tenho n'alma as tatuagens
Da minha origem cigana.
Apreciemos a técnica do valoroso artista, na formação das estrofes:
Fui criado entre as miragens,
Na solidão do deserto,
De um povo que andava incerto,
Tenho n'alma as tatuagens:
São abstratas imagens
De Alá, que não se profana;
Dos chefes de caravana,
Me orgulho em ser porta-voz:
Os primitivos heróis
Da minha origem cigana!
Os antigos personagens,
Defensores dos escravos;
De uma legião de bravos,
Tenho n'alma as tatuagens!
Fugindo às velhas linhagens
Da imposição duridana,
Por vontade soberana,
Ismael foi peregrino,
O primeiro beduíno
Da minha origem cigana!
Na segunda, os versos do mote ficam conjugados, isto é, formam as linhas nove e dez da estrofe. Vejamos a Décima com este final comovente:
Ao pé do monte Calvário,
Jesus chorava e gemia!
Junto de dois malfeitores,
Via-se um pobre moribundo:
Era o Salvador do mundo,
Senhor de todos senhores!
Refúgio dos pecadores,
De quem sofre nostalgia!
Se quisesse, sairia
Daquele estado precário:
Ao pé do monte Calvário,
Jesus chorava e gemia!
O mote de uma linha é raramente usado. Seu único verso fecha a estrofe.
9 - Martelo agalopado:
O Martelo atual, criação do genial violeiro paraibano Silvino Pirauá Lima, é uma estrofe de dez versos, em decassílabos, obedecendo à mesma ordem de rima dos versos da Décima. Todavia, sua denominação não vem do fato de ser empregado como meio de os contadores se martelarem durante suas pugnas. Sua significação está ligada ao nome do diplomata francês Jaime de Martelo, nascido na segunda metade do século XVII, que foi professor de literatura na Universidade de Bolonha, portanto, o criador do primeiro estilo. Jaime de Martelo suprimiu duas linhas finais da Oitava de Ariosto, ou Oitava camoniana, formando o que se denominou de Martelo cruzado, isto é, no Martelo antigo a primeira linha rima com a terceira e a quinta; a segunda, com a quarta e a sexta. O exemplo deste gênero está na estrofe do paraibano José Camelo de Meio Rezende:
O orgulho nasceu em noite escura,
E é filho da triste ignorância,
Ao descer o seu corpo à sepultura,
Cai-lhe verme por cima, em abundância,
E seu todo se torna uma figura,
Que nos causa a maior repugnância.
Depois, como variante, apareceu o Martelo com rimas destacadas, também denominado de Martelo solto ou de Sextilha em decassílabo. O diplomata brasileiro Francisco Otaviano utilizou-se deste gênero para cantar suas "Ilusões da Vida":
Quem passou pela vida em branca nuvem,
Num plácido repouso, adormeceu;
Quem não sentiu o trio da desgraça,
Passou pela vida e não sofreu:
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida e não viveu.
Feitas essas considerações sobre os Martelos de seis versos, mostraremos o estilo atual, variante da Décima, criação do violeiro Silvino Pirauá Lima, conforme estrofe do poeta lira Flores, citada pelo Dr. Ariano Suassuna, num trabalho sobre os cantadores:
Quando as tripas da terra mal se agitam,
E os metais derretidos se confundem,
E os escuros diamantes que se fundem,
Da cratera ao ar se precipitam.
As vulcânicas ondas que vomitam
Grossas bagas de ferro incendiado,
Em redor, deixam tudo sepultado
Só com o som da viola que me ajuda,
Treme o sol, treme a terra, o tempo muda,
Eu cantando Martelo agalopado.
Esse gênero belo e difícil via crucis dos fracos repentistas, é empregado não só nos grandes debates, mas nos trabalhos escritos, em geral.
10 - Galope à beira-mar:
Gênero muito apreciado pelos apologistas da Poesia Popular que, juntamente com o Martelo, recebeu a denominação de Décima de versos compridos. O Galope é assim chamado em virtude de ser empregado mais em temas praieiros. È constituído de uma estrofe de dez versos de onze sílabas, com o estribilho cuja palavra final é mar.
Foi criado pelo violeiro cearense José Pretinho (não o da peleja do cego Aderaldo), filho de Morada Nova, vaqueiro do "coronel" José Ambrósio, falecido em Lavras da Mangabeira. Contam que José Pretinho, após levar uma surra, em Martelo, de Manoel Vieira Machado, cantador piauiense, veio a Fortaleza e, na Praia de Iracema, observou o mar, cujo movimento das ondas se parecia com o galope dos cavalos da fazenda do "coronel" Ambrósio. Criado o estilo, procurou o adversário para a desforra. Deixou-o aniquilado. Mergulhão de Sousa divulgou o gênero por todo o Nordeste. Dimas Batista, cantando no Teatro Santa Isabel, em Recife, improvisou sob aplausos:
Eu cantando a Galope ninguém me humilha,
Tudo que existe no mar eu aproveito,
Na ilha, no cabo, península, estreito,
Estreito, península, no cabo, na ilha,
Em navio, em proa, em bússola e milha!
Medindo a distância para viajar,
Não quero, da rota, jamais me afastar,
Porque me afastando o destino saí torto;
Confio em Deus avistar o meu porto,
Cantando Galope na beira do mar!
José Limeira, Poeta do Absurdo, dá-nos exemplo de tremendo disparate:
Conheço, demais, o rio Paraíba,
Que nasce sozinho, lá dentro da praia!
Parece um cambito de pau de "cangaia",
As suas enchentes têm mel de tubiba;
Na frente, recebe o rio Furiba,
passa correndo pra Madagascar;
Alaga Recife, demora em Dacar,
No tempo de inverno é seco demais:
Foi quando "Oliveiro" enfrentou Ferrabrás,
Que luta pai-d'égua na beira do mar!
O violeiro cearense Simplício Pereira da Silva, residente na vila de Barreiras, município de Redenção, criou um estilo interessante de Galope, que ele denominou de "Galope por dentro do mato". Trata-se de um gênero que cuida, exclusivamente, de temas sertanejos. As estrofes abaixo são de sua autoria:
Companheiro, eu do mar não conheço nada,
Nunca fui à praia e menos ao banho,
Pois o mar é um lago pra mim tão estranho,
Que parece até um mistério de fada ...
Eu gosto bastante é de uma caçada,
Lá no meu sertão, muito embora que ingrato!
Pra você não pensar que estou com boato:
Uma meia hora vamos pelejar. .
Pegue lá seu peixe por dentro do mar,
Que vou caçar peba por dentro do mato.
No sertão, à caçada, eu fui certo dia,
Num mato fechado, bem desconhecido,
Mas eu, na caçada, fui meio atrevido;
Chegando no mato, o sol já pendia ...
Tinha onça por praga, e eu não sabia;
Saí pisando devagar no sapato;
Senti um mau cheiro, pensei que era gato.
Quando vi a onça e a onça me viu:
E o corpo tremeu e meu rifle caiu...
Foi carreira feia por dentro do mato!
Nota do editor do Jornal de Poesia:
Em matéria de Galope na beira do mar, este, de Luciano Maia, é simples esplendoroso. Clique na figura para ver que perfeição.
11 - Parcela:
A Parcela é uma Décima com versos de quatro ou de cinco sílabas, conhecida também pela denominação de Décima de versos curtos.
Há cantadores que ainda usam a Parcela para a "Despedida", que costumeiramente é feita no final das apresentações. Coutinho Filho, em Violas e Repentes, apresenta duas estrofes, com quatro sílabas em cada verso, da peleja de Pedra Azul com Manoel da Luz Ventania:
Eu sou judeu
Para o duelo!
Cantar Martelo
Queria eu!
O pau bateu,
Subiu poeira!
Aqui na feira,
Não fica gente!
Queima a semente
Da bananeira!
Manoel da Luz Ventania revidou-o pelo ataque a Bananeiras, terra de seu nascimento:
Sou bananeira ...
Do alagadiço!
Você diz isso
Por brincadeira!
Meto a madeira,
Quebro a viola!
Só me consola
Te ver, um dia,
De vara e guia,
Pedindo esmola!
Da peleja de José Félix com o cego Benjamim Mangabeira, recentemente falecido em Fortaleza, colhemos estas Parcelas de cinco sílabas:
J.F.
Sou velho na vida,
Sou feito na arte…
De parte a parte,
Conheço a batida!
Na trilha seguida,
Levanta poeira!
E, na cachoeira,
As águas descendo,
E o povo dizendo:
"Correu, Mangabeira!"
B.M.
Eu dou, tu apanha(s)!
Eu vou e tu fica(s)!
Levando tabica
Por causa da manha!
Foi tua campanha,
Caído no porre…
Eu vivo, tu morre(s)!
É no K, é no L!
Conhece, Zé "Fele",
Mangaba não corre!
Da imortal peleja de José Pretinho com o cego Aderaldo, escrita pelo genial poeta piauiense, de Parnaíba, Firmino Teixeira do Amaral, registramos estas Parcelas de cinco sílabas:
Cego Aderaldo:
Negro é raiz
Que apodreceu!
Casco de judeu,
Moleque infeliz!
Vai pra teu país:
Senão eu te surro,
Dou-te até de murro!
Tiro-te o regalo,
Cara de cavalo,
Cabeça de burro!
Pretinho:
Fale doutro jeito,
Com melhor agrado,
Seja delicado,
Cante mais perfeito:
Olhe, eu não aceito
Tanto desespero...
Cante mais maneiro,
Com verso capaz,
Façamos a paz:
Reparta o dinheiro.
12 - Quadrões:
Ao longo do tempo, o Quadrão tem sido o gênero a receber o maior número de alterações, não só na sua forma interna, mas, também, na estrutura das estrofes, em geral. O Quadrão antigo é formado por uma estância de oito linhas, pertencente à família dos setessílabos, rimando o primeiro verso com o segundo e o terceiro; o quarto com o oitavo, e o quinto com o sexto e o sétimo, contando, no final, o estribilho de sua denominação. Com Lourival Batista, um Quadrão à antiga:
O Cantador repentista,
Em todo ponto de vista,
Precisa ser um artista
De fina imaginação,
Para dar capricho à arte,
E ter nome em toda parte,
Honrando o grande estandarte
Dos oito pés de Quadrão!
Posteriormente, o Quadrão em oito apareceu com ligeira modificação na sua forma interna, isto é, o quarto verso que rimava somente com o oitavo passou a rimar também com o quinto. Numa homenagem póstuma ao ilustre mestre Lacerda Furtado, transcrevemos um Quadrão no novo estilo, por ele escrito e oferecido ao grande cordelista paraibano Joaquim Batista de Sena:
Namorando a Salomé,
Vi a barca de Noé,
Palestrei com Josué,
Com Jacó e Salomão;
Travei luta com Sansão,
Nadei no delta do Nilo,
Montado num crocodilo,
Cantando os oito em Quadrão!
13 - Quadrão trocado:
Com versos de doze sílabas, e conservando a mesma ordem das rimas do estilo anterior, criou-se o Quadrão trocado, gênero que exige muita segurança e desembaraço do repentista; apresentando, a partir da terceira linha, palavras que vão se alternando no verso subseqüente. As duas últimas linhas da estrofe formam o estribilho que se encerra com a palavra Quadrão. O repentista Dimas Batista improvisou esta difícil estrofe:
É no sangue, é no povo, é no tipo, é na raça,
É no riso, é no gozo, é no gosto, é na graça,
É no pão, é no doce, é no bolo, é na massa:
É na massa, é no bolo, é no doce, é no pão;
É cruzado, é vintém, é pataca, é tostão,
É tostão, é pataca, é vintém, é cruzado;
É Quadrão, é Quadrinha, é Quadrilha, é Quadrado,
É Quadrado, é Quadrilha, é Quadrinha, é Quadrão.
Não só na forma, mas na estrutura, o Quadrão sofreu alterações bem acentuadas. Daí, quatro tipos de Quadrões incluídos na Décima; todos com o estribilho na última linha da estrofe.
Coutinho Filho apresenta, de Antônio Batista Guedes, sobrinho de Ugolino do Sabugi, dois tipos de Quadrões. O primeiro diferença-se do segundo por ser este dialogado:
Longe do mar de Netuno,
O cocheiro Faetonte
Percorria o horizonte
No seu coche de tribuno,
De Anfitrite e de Juno,
Tinha ele a proteção!
Apolo, tendo na mão
Um livro de poesia,
Me ensinou com galhardia
Cantar dez pés em Quadrão!
A. Júpiter onipotente,
B. Tendo o trono conquistado,
A. Por ter seu pai expulsado,
B. Do céu traiçoeiramente
A. Porque, de reinar somente,
B. Era a sua pretensão!
A. Da maior constelação,
B. Íris, num carro, desceu,
A. E a inspiração me deu
B. Nestes dez pés a Quadrão!
O Quadrão dialogado apresenta-se agora, com uma pequena modificação: o último verso deste novo tipo é cantado pelos dialogantes, e não por um só, como no caso anterior. A estrofe que se segue é de um desafio dos cantadores cearenses Simplício Pereira da Silva e Manoel Furtado, quando dialogavam, fazendo referências a um sapo que penetrava no salão, onde contavam:
S.P. Colega, lá vem um sapo,
M.F. Ou por outra, um cururu!
S.P. Não vem vestido nem nu,
M.F. Porém vem batendo o papo!
S.P. Eu, nele, dou um sopapo!
M.F. Boto fora do salão ...
S.P. Pego, nele, com a mão;
M.F. Depois rebolo no mato ...
S.P. O guaxinim come o fato,
S.P. e M.F. Lá se vai dez a Quadrão!
Há pouco, os irmãos Batista criaram este gênero de Quadrão em dez, que se diferença do estilo anterior, apenas por ser constituído de perguntas e respostas, o que vem a exigir grande parcela de esforço e de dom poético: cada pergunta deve ser respondida com inteligência e segurança, para o bom êxito da estrofe. Imaginemos dois cantadores (A e B), num duelo cerrado:
A. Para que serve a ciência?
B. Para evoluir o mundo.
A. Para que serve um segundo?
B. Para aumentar a existência.
A. Para que serve a seqüência?
B. Pra dar continuação.
A. Pra que serviu Lampião?
B. Pra dar trabalho a soldado,
A. Naquele tempo passado...
A e B. Lá se vai dez a Quadrão!
14 - Gabinete:
Gênero que foi muito apreciado pelo imortal cego Aderaldo, porém de pouco uso atualmente. É cantado em versos de sete sílabas, sem número de linhas determinado, e com estribilhos nas linhas: sete, oito, nove, dez e nas duas últimas. Otacílio Batista exemplifica:
O povo deseja ouvir
Um Gabinete bonito;
Poeta, só acredito
Se você não me mentir.
Trate de se prevenir
Para poder cantar bem
Eu comprei um cartão
Para viajar no trem:
Sem cartão ninguém vai,
Sem cartão ninguém vem!
Vai e vem, vem e vai,
Vem e vai, vai e vem.
Quem não tem o que eu tenho,
Morre danado e não tem!
Quem estiver com inveja,
Se esforce e faça também ...
Cavalo bom é ginete;
Quem não canta Gabinete,
Não é cantor pra ninguém!
O violeiro cearense, Alberto Porfírio, criou um estilo de Gabinete mais interessante e simplificado: o Cantador faz uma Quadra, em seguida, seis versos de onze sílabas, com rimas que se casam (rimas iguais), desenvolvendo, nestes, o tema da Quadra. Para finalizar, faz três versos de sete sílabas, rimando o primeiro com a estribilho (Quem não canta Gabinete), e o terceiro com os versos da Sextilha. O exemplo abaixo é do próprio criador do estilo:
Quem é forte não se gaba,
Não se altera nem se agita,
Mas qualquer homem se acaba
Por uma mulher bonita!
Amei uma jovem que me queria bem,
Eu gostava dela mais do que ninguém;
Chegou lá um cabra mexendo xerém,
Mas eu tendo raiva, não temo a quem vem!
De faca e de bala, eu brigo com cem...
Quebramos cadeira, víramos um trem!
Resolvi foi no cacete;
Quem não canta Gabinete,
Não se diz que canta bem.
15 - Toada alagoana:
É um gênero pouco usado, porém muito bonito, em virtude das rimas encadeadas e da agradável toada. Sirvo-me de uma estrofe de Otacílio Batista, companheiro de trabalho, para mostrar este gênero:
Vai Otacílio Batista,
Repentista,
Neste momento tão forte,
Num estilo diferente,
No repente,
Correndo em busca da sorte...
Em noite de lua cheia,
Sou a sereia
Dos oceanos do norte!
Ao lado da toada alagoana, existe o Martelo alagoano, cuja diferença do Martelo agalopado está na toada, que é um pouco mais lenta, bem como no estribilho, que apresenta no final das estrofes com a palavra de sua denominação.
16 - Meia quadra:
Entre as modalidades mais difíceis da Poesia popular, está a Meia Quadra, estilo que apresenta estrofes com número de versos não determinados, e com quatro linhas iguais na parte final:
Quando eu disser vida e meia,
Você diga meia vida;
Quando eu disser ida e meia,
Você diga meia ida,
Quando eu disser lida e meia,
Você diga meia lida.
Diga coração e meio.
Se eu disser meio coração;
Se eu disser meia baleia,
Você diga meio cação,
Se eu disser meio cação,
Você diga meia baleia;
Quando eu disser Meia Quadra,
Você diz que é Quadra e Meia,
Quando eu disser Quadra e Meia,
Você diz que é Meio Quadrão!
17 - Dez pés de queixo caído:
Este gênero, ainda em voga, está incluído na Décima, apresentando, no final de cada estrofe, este estribilho: "NOS DEZ DE QUEIXO CAÍDO":
É tão grande o meu valor,
Que o mundo todo o conhece;
A poesia se oferece...
Eu, dela, sou professor!
Eu não temo a Cantador
Por mais que seja sabido!
Faz tempo que não divido
O que tenho com ninguém:
Assim vou passando bem
Nos Dez de Queixo Caído!
18 - Gemedeira:
Pela própria denominação do gênero, vemos que serve para temas gracejantes. É a Gemedeira um estilo de poesia, caracterizado pela interposição de verso de quatro, ou, raramente, de duas sílabas, entre a quinta e a sexta linhas da Sextilha, formado pelas interjeições: "ai! e ui! ou ai! e hum!" Após cantar outros estilos com José
Soares do Nascimento, Severino Pinto mudou para Gemedeira:
Cantei Mourão a Galope,
Versejando como entendo!
Vou passar pra Gemedeira,
Como me pedem, eu atendo!
Há pouco, cantei me rindo.
Ai! ai! ui! ui!
Agora canto gemendo!
Com a supressão de "ui! ui!", teremos o sexto verso com duas sílabas, conforme estrofe de José Soares do Nascimento:
Sem querer tirar nem pôr,
Você chora e eu também!
Como nos falta dinheiro,
Tira-se, aqui, de quem tem!
Choro de Cantador liso...
Ai! ai!
Não se oculta de ninguém!
Dissemos, no início deste capítulo, que trinta e seis eram os estilos da Poesia Popular. É bem verdade que não descrevemos esse total, pois achamos melhor estudar aqueles ainda em uso, com maior ou menor intensidade. Todavia, considerando seus grandes empregos no passado, faremos um ligeiro estudo sobre a Quadra e sobre a Ligeira.
19 - Quadra:
Definitivamente retirada da área do improviso, a Quadra é constituída de uma estrofe de quatro versos, que podem ser de sete ou de dez sílabas. Todavia, iremos apresentar mais a sete sílabas, por ser a melhor a se enquadrar na temática deste livro.
Quadra simples: Na quadra simples, somente as linhas pares são rimadas, permanecendo as demais em versos brancos.
Doutor Manuelito Eduardo Campos, em sua desabusada obra Cantador, Musa e Viola, traz esta quadra de origem latina (Séc. XIII), mas que ele atribui a José Matos, cearense do Cariri:
No seio da virgem pura
Entrou a Divina Graça
Como entrou, assim saiu
Qual o sol pela vidraça!
Quadra oposta: Tem a denominação acima, em virtude de o primeiro verso rimar com o último. O segundo e o terceiro foram a chamada rima paralela:
Quem ama moça solteira
De Deus, terá perdão:
Porque nosso pai Adão
Teve sua companheira!
Quadra cruzada: O jovem trovador cearense e jornalista gabaritado, César Coelho é o autor destas belíssimas Quadras, que nos escrevemos com satisfação:
Coisa linda é madrugada,
Com luar pelo terreiro,
Viola em beira de estrada,
Cantiga de violeiro.
Quero a paz do teu carinho,
Mil cantigas de viola,
Quero ouvir um passarinho,
Que não seja na gaiola ...
Quadra persa: É assim denominada por ser de criação dos poetas persas. Nela, riam-se as linhas 1ª, 2ª e 4ª. A 3ª constituída de um verso branco.
O brilhante a respeitável mestre, Rebouças Macambira, dá-nos este exemplo ao traduzir o poema Rubayat, do imortal Omar Khayan:
Desperta que a rabugenta madrugada
Do céu espanta a noite constelada
E sol envolve a torre da mesquita
Em feixe de luz avermelhada.
20 - Ligeira:
Como a Quadra, a Ligeira está afastada totalmente do terreno do improviso. Sua denominação vem do fato de ser cantada com a maior rapidez possível. O Cantador fazia versos de sete sílabas, com rimas obrigatórias para os de ordem par, e sem número de linhas determinado.
No capítulo anterior, temos um exemplo de Ligeira, na saudação do poeta Manoel Bandeira aos violeiros do Nordeste. Finalizando o estudo sobre os gêneros principais da Poesia Popular, confessamos que o fizemos com o propósito de prestar, aos amantes da nossa "Poesia Bárbara", certos esclarecimentos que há tempos eram esperados.
Cantou para os presidentes da república: Eurico Dutra, Juscelino Kubitschek, João Goulart e Jânio Quadros, e para o Papa João Paulo II, Roberto Carlos e Pelé.
Autor da letra da consagrada música MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA FAZ O HOMEM GEMER SEM SENTIR DOR, gravada e cantada por Amelinha, Zé Ramalho, Bia Marinho e outros intérpretes.
É autor dos seguintes LIVROS:
· Poemas e canções;
· Antologia ilustrada dos cantadores (em parceria com Francisco F. Linhares, do ceará);
· Ria até cair de costas;
· Poemas que o povo pede;
· A criança abandonada e outros poemas;
· Os versos apimentados do velho João Mandioca;
· O caçador de veado;
· O que é que me falta fazer mais?
· Entre outros.
CORDÉIS:
· Zé Limeira – Poeta dos Disparates;
· Peleja de Zé Limeira com João Mandioca;
· Zé Américo em versos;
· O valor que o chifre tem;
· Versos à Câmara Cascudo;
· Apelo ao Papa;
· Peleja de Otacílio Batista com Zé Ramalho;
· Dr. Alisando Cresce;
· Os bichos contra a ciência;
· O namoro de hoje em dia;
· Peleja de Pelé com Pedro I;
· A morte de Padre Zé;
· E outros.
DISCOS:
· Otacílio e Dimas batista;
· Cantador, verso e viola;
· Viola, verso e viola;
· Repentistas – os gigantes do improviso;
· Apelo ao papa;
. O Papa e o Jegue;
· Otacílio Batista do Pajeú;
· Só Deus improvisa mais;
· MEC Secretaria de Cultura;
· Gigantes do improviso;
· Meio século de viola;
· E outros.
PARTICIPAÇÕES ESPECIAIS:
· MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA;
· COLETÂNEA DE REPENTISTAS e outros livros;
· Canção: Lua divina – Gravada por Oliveira de Panelas;
· NORDESTE: CORDEL, REPENTE;
· Canção: gado bom quem tem sou eu.
VIOLAS DE LUTO
Lourinaldo Vitorino –Poeta repentista, em 06/08/2003
As violas de luto soluçando
Dão adeus ao Bocage do repente,
Um fenômeno de arte, um expoente,
Que de cinco a seis décadas improvisando
Sua voz de trovão saiu rasgando
Modulando a palavra em cada nota
Pra cultura um nocaute, uma derrota,
Um desastre, uma perda, um golpe horrendo,
Enlutado o repente está perdendo
OTACÍLIO BATISTA PATRIOTA.
Para a arte esse gênio é o auxílio
Que Deus deu de presente a todos nós
Seu baião sonoroso e sua voz
Soam agora no túmulo de Hercílio,
Com certeza a figura de OTACÍLIO
Nesse instante viaja em cada mente
Num cordel de estrelas reluzente
Com seu porte de oficial romano
Qual a John Wayne no Oeste americano
Firme, austero, implacável e surpreendente.
Na arena do verso improvisado
OTACÍLIO passou por toda a prova
Enfrentou Zé Faustino Vilanova,
A caneta estratégica do passado,
Quando Pinto se impôs, foi consagrado,
Duelando com Dimas e Hercílio
A viola era o único utensílio
Que usava no palco esse gigante
Seu revólver era o verso fulminante
Que impunha a grandeza de OTACÍLIO.
O repente sem OTACÍLIO chora,
As viloas de luto cantam e tremem,
As sextilhas satíricas clamam e gemem,
Os sertões no silêncio nesta hora
Ouvem o povo que angustiado implora,
Que Deus abra o portão do céu divino,
E que São Pedro soluce e toque o sino
Que a terra chorando viu perder
Um brilhante, importante ser,
Condutor do repente nordestino.
BRÁULIO TAVARES
Numa nuvem do Céu que tem escrito
“Botequim da Poesia Brasileira”,
OTACÍLIO chegou, puxou cadeira,
e encostou na parede do Infinito.
Na platéia se ouvia palma e grito,
vi até JESUS CRISTO assobiando,
OTACÍLIO, a viola ponteando,
se juntou ao baião de LOURO e DIMAS,
num dilúvio de glosas e de rimas...
A trindade no Céu está cantando.
Estrofes de OTACÍLIO BATISTA
Seis Poetas geniais
honram da poesia o manto,
seis estrelas divinais,
que o mundo admira tanto:
Dante, Camões e Virgílio,
Louro, Dimas e Otacílio,
NÃO MORREM, MUDAM DE CANTO.
Este livro dedicado
aos três irmãos cantadores,
foi por Deus abençoado
lá no Pajeú das Flores,
numa pequena cidade,
berço da imortalidade,
de uma beleza sem fim,
dos poetas sonhadores,
naturais de Itapetim,
do mais puro domicílio,
LOURO, DIMAS e OTACÍLIO.
MULHER NOVA, BONITA E CARINHOSA FAZ O HOMEM GEMER SEM SENTIR DOR
Numa luta de gregos e troianos
Por Helena, mulher de Menelau,
Diz a História que um cavalo de pau
Acabava uma guerra de dez anos....
Menelau, o maior dos espartanos,
Venceu Páris, o grande sedutor,
Humilhando a família de Heitor,
Em defesa da honra caprichosa.
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Alexandre, figura desumana,
Fundador da famosa Alexandria,
Conquistava, na Grécia e destruía
Quase toda a população tebana.....
A beleza atrativa de Roxana
Dominava o maior conquistador;
E depois de vencê-la, o vencedor
Entregou-se à pagã mais que formosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
A mulher tem, na face, dois brilhantes
Condutores fiéis do seu destino;
Quem não ama o sorriso feminino,
Desconhece a poesia de Cervantes,
A coragem dos grandes navegantes
Enfrentando a procela em seu furor.
Se não fosse a mulher, mimosa flor,
A história seria mentirosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Virgolino Ferreira, o Lampião
Bandoleiro das selvas nordestinas,
Sem temer o perigo nem ruínas,
Foi o rei do cangaço no sertão;
Mas, um dia, sentiu, no coração,
O feitiço atrativo do amor:
A mulata da terra do condor
Conquistava uma fera perigosa!
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor.
Na velhice o sujeito nada faz,
a não ser uma igreja que visita,
mas se acaso encontrar mulher bonita,
ele troca Jesus por satanás...
pensa logo no tempo de rapaz,
diz pra ela me ame por favor,
a resposta que vem é não senhor,
sua idade passou, deixe de prosa!
Mulher nova bonita e carinhosa
faz o homem gemer se sentir dor.
LUA DIVINA
Lua divina, peregrina e feiticeira,
tão brasileira como não tem outra igual,
angelical pela sua formosura
e noiva pura dos poetas do sertão,
não tenho lar nem esposas nem carinho,
nem um filhinho a quem dê meu coração,
e por viver sem prazer e tão sozinho
a ti ó lua dediquei essa canção.
APELO AO PAPA
Fiz da santa poesia a mensageira
Da pobreza mais pobre do país,
É pequeno o poeta que não diz
Quando sofre a criança brasileira
Ninguém pode viver dessa maneira
Sem um teto, sem lar, sem pão, sem nome:
Quem é filho de rico bebe e come,
Quem é filho de pobre não escapa,
As crianças sem papa pedem ao PAPA
Santo Papa dê papa a quem tem fome.
O POETA
A virtude é o caminho do amor,
sem o amor deste mundo, o que seria?
A matéria sem luz não tem valor;
ninguém vive sem Deus em companhia...
a poesia é o jardim do Criador,
o jardim do poeta é a poesia.
O POETA E O PASSARINHO
O poeta e o passarinho
são ricos de inteligência
simples como a natureza
eternos como a ciência
estrelas da liberdade
peregrinos da inocência.
Herdeiros da providência,
um no chão, outro voando,
UM PENA COM TANTA PENA,
OUTRO SEM PENA PENANDO,
UM CANTA CHEIO DE PENA,
OUTRO SEM PENA CANTANDO.
O poeta sofre quando
vê um pobre passarinho
nas grades de uma gaiola
sem ter direito a seu ninho
são iguais no sofrimento
o poeta e o passarinho.
O poeta afina o pinho
no viveiro da garganta
o passarinho poeta
por entre as folhas da planta
sem viola metro e rima
só Deus sabe o que ele canta.
Do poeta a musa é santa
santa musa da poesia
passarinho canta e voa
no espaço rodopia
faz ziguezigue no corpo
brincando com a ventania.
Ao romper de um novo dia
o passarinho gorjeia
canta o poeta a saudade
no clarão da lua cheia
faz da viola um piano
da garganta uma sereia.
O poeta traz na veia
os segredos do além
quando canta de improviso
não pergunta de onde vem
o poeta e o passarinho
não sabem o valor que tem.
O poeta vive sem
ódio, maldade e rancor,
ainda sendo traído
perdoa o seu traidor,
canta alegre o passarinho
sublimes canções de amor.
O poeta e o beija-flor
ambos vivem sem ciúme
um que canta, outro que voa
da planície ao alto cume,
um de versos perfumado
outro colhendo o perfume.
Nas camadas do verdume
o passarinho vegeta
não disse nem a metade
dessa dupla tão completa,
do poeta ser humano
do passarinho poeta.
NÃO OFENDA A NATUREZA
Não ofenda a natureza,
inocente e sem maldade,
a dona do pão d mesa,
coração da humanidade.
Em nome da consciência,
deixa a natureza em paz,
verde fonte da inocência,
mãe de todos os mortais.
...........
Apelo para vocês,
em nome de quem não erra,
vamos salvar dessa vez
o organismo da terra:
mares, rios, cataratas,
serras, colinas e matas,...
toda essa imensa grandeza,
pouca gente compreende
que a vida humana depende
do pulmão da natureza.
COISAS DO SERTÃO
Ao romper da madrugada,
um vento manso desliza,
mis tarde ao sopro d brisa,
sai voando a passarada.
Uma tocha avermelhada
aparece lentamente,
na janela do nascente,
saudando o romper da aurora,
no sertão que a gente mora
mora o coração da gente.
O cantador violeiro
longe da terra querida,
sente um vazio na vida,
tornando prisioneiro,
olha o pinho companheiro,
aí começa a tocar,
tem vontade de cantar,
mas lhe falta inspiração.
Que a saudade do sertão
faz o poeta chorar.
ROSINA
Mãe, perfeita e carinhosa,
de amor e dedicação,
aos onze filhos que teve,
não faltou água nem pão,
antes quem vivia só,
é hoje, mãe e avó,
da mais bonita união,
aos onze filhos completos
e aos seus quatorze netos
entregou seu coração.
O CORPO DA MULHER NUA
A mulher com a natureza
nasceram com a mesma sina,
sem elas o pão da mesa
nos lares se contamina.
A roupa esconde a beleza
da beleza feminina.
Não há planta que floresça
quando a seca não recua,
não há poeta que cresça
jogando pedras na lua,
nem há roupa que mereça
o corpo da mulher nua.
João Pessoa tem razão,
Os seus filhos têm valores,
O Estado além de culto
De famosos escritores,
é amigo da cultura,
berço da literatura
e Centro dos cantadores.
Quando pego na viola
nesta viola querida,
eu me sinto noutro mundo,
numa existência florida,
vão-se todas as tristezas,
todas as mágoas da vida.
Velho, caduco e doente,
cambaleando na rua,
diante de mulher nua,
nem dor de cabeça sente.
O passarinho inocente
abre as asas do passado,
ergue o pescoço furado,
mergulha naquela planta.
Mulher pelada levanta
salário de aposentado.
ROJÃO PERNAMBUCANO
Certa vez fui convidado
Para dançar numa festa
Perto de Nova Floresta
Na Vila do Pau Inchado
Eita forró animado:
Chega a poeira cobria
Mas a mulher que eu queria
Do Pau não se aproximava
Quando eu ia ela voltava
Quando eu voltava ela ia.
A garota Manuela
Quis viver só de um negócio
Entrava sócio e mais sócio
Dentro do negócio dela
Eu fui lá falar com ela
Mostrando o que possuía:
Ela somava e media
Meu negócio não entrava
Quando eu ia ela voltava
Quando eu voltava ela ia.
“Segue OTACÍLIO a corrente,
poeta por excelência,
dotado da providência,
inspirado no repente,
vive na linha da frente,
como bom compositor,
formado sem ser doutor,
Deus lhe deu o dom de ser
repentista até morrer,
Poeta, Artista e Escritor.
(Estrofe de Anísio Lira)”.
O VALOR QUE O PEIDO TEM
(Otacílio Batista Patriota)
O peido é bom toda hora
Sem peido não há quem passe
A criança quando nasce
Tanto peida como chora
Um peido ao romper da aurora
Eu não troco por ninguém
Há noites que eu solto cem
Peidos grandes e pequenos
Já conheço mais ou menos
O valor que o peido tem
Um velho já moribundo
Nas agonias da morte
Soltou um peido tão forte
Que se ouviu no outro mundo
O peido gritou no fundo
Que só apito de trem
O velho sentiu-se bem
Levantou-se no outro dia
Dizendo a quem não sabia
O valor que o peido tem
Pela porta do bufante
Para não morrer de volvo
Diariamente eu devolvo
Peido grande a todo instante
O sujeito ignorante
Não me compreende bem
Fecha a porta do sedem
Deixa o peido apodrecer
Esse morre sem saber
O valor que o peido tem
Um peido silencioso
Por baixo de um cobertor
É tão grande o seu valor
Que descrevê-lo é custoso
Cheira mais que o mais cheiroso
Vale de Jerusalém
As roseiras de Siquem
As savanas do Saara
Nada disso se compara
O valor que o peido tem
Ofende muito a pressão
peido grande encarcerado
Deixa o corpo aliviado
Depois que sai da prisão
As veias do coração
Controlam-se muito bem
Sente o coração também
Uma alegria sem par
Ninguém sabe calcular
O valor que o peido tem
Uma dor que faz mudar
A cadencia dos ouvidos
São os peidos recolhidos
Que você não quis soltar
Não vá se... prejudicar
Em respeito a seu ninguém
O velho Matusalém
Quase mil anos viveu
Porque toda vida deu
O valor que o peido tem
Um negro foi se casar
Ou se casava ou morria
Peidou tanto neste dia
Quase derruba o altar
A noiva foi reclamar
Findou peidando também
O padre disse meu bem
Ninguém dar mais do que eu
O valor que o peido tem
Peido azedo de água soda
Fede a casca de limão
E de jabá com feijão
Passa folgado na roda
Peido nenhum se encomoda
Com censuras de ninguém
Presta um favor quando vem
Aliviar quem padece
É quando a gente conhece
O valor que o peido tem
Peido fedendo a chulé
Num samba de madrugada
Sai com tanta misturada
Que ninguém sabe o que é
Mais um peido de Pelé
Jogador que vive bem
Passa veloz no vintém
Não há goleiro que pegue
Nenhum bom juiz que negue
O valor que o peido tem
Que prazer eu não teria
Se um peido se apresentasse
Bem fedorento e peidasse
Deixando a fotografia
Mas o peido não confia
Nos olhos de seu ninguém
São mistérios do além
Não posso compreender
Mas vale a pena saber
O valor que o peido tem
Um peido em pleno verão
Cheirando a cu de veado
Tava sendo arrematado
Numa festa de leilão
Quando chegou num milhão
Não quis mais gritar ninguém
Naquilo o prefeito vem
Dizendo a honra me cabe
Minha prefeitura sabe
O valor que o peido tem
Dizia o velho Abranhão
Para seu neto Isau
O peido agradece ao cu
Depois que sai da prisão,
Peidava um tal de Sansão
Pelado, e cego de guia
Temendo a onda bravia
Moisés peidou no oceano
E o papa no Vaticano
Só peida uma vez por dia
Alguém disse que Jacó
Quando casou com Raquel
Passou a lua de mel
Peidando de fazer dó
Esse parente de ló
Era genro de Labão,
Davi, pai de Salomão
Poeta, Rei e pastor
Peidava fazendo amor
Na cama fria do chão.
O homem velho esmorece
Assim que a noite aparece
Se deita e faz uma prece
Lá num canto da parede,
Meia noite se levanta
Com secura na garganta
Pega um caneco de frande
Vai ao pote mata a sede
Solta quatro peido grande
Volta cegado prá rede.
Peido fino é safadeza
Peido alto é cretinice
Peido suave é meiguice
Peido baixo o é sutileza
Silencioso é firmeza
Peido brando indica paz
O grosso é dos anormais
Sempre indica frouxidão
Mas chegando a perfeição
O homem não peida mais.
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Uma notícia dos poetas:
FRANCISCO LINHARES:
Conheci Linhares por apresentação do meu compadre, dentista e advogado, José Wilson Sales, mais ou menos à época da publicação da Antologia Ilustrada dos Cantadores. Estou com o volume em mãos, uma 2ª Edição, Universidade Federal do Ceará, 1982. Acho que havia eu adquirido a primeira edição, de 1976, também pela UFC. Contudo, sou um fino "perdedor" de livros, do que muito me orgulho, a espalhá-los com os amigos. (Clique na figura ao lado para conhecer a Biblioteca Cururu, um manifesto anti-estantes). Meu interesse pela literatura era, então, quase nenhum. Mesmo assim conversamos sobre Zé-Limeira (Orlando Tejo), e amenidades gerais. Um velhote muito simpático e distinto, assim me pareceu o Francisco Linhares. Vou digitar aqui no Jornal de Poesia o que dele eu for encontrando. Quem sabe um contacto com a família, e surjam mais coisas. Os leitores bem que podem ajudar: fotos, ensaios, outros escritos. Ele me disse que não era um cantador, um violeiro; pesquisador somente. E que pesquisador!, digo-lhes eu.
OTACÍLIO BATISTA
Não conheci pessoalmente. O cabra é dos bons, aliás, ótimo. A batistada inteira, são vários irmãos, todos poetas da melhor estirpe. Clique aqui para a página dele.
A ANTOLOGIA propriamente dita:
É o livro que eu gostaria de mandar reeditar para distribuir gratuito com os amigos, bibliotecas, faculdades de letras e professoras de literatura da lusofonia. Obra definitiva, quase 500 páginas, abordando o campo teórico do Cordel e trazendo as mais belas e presepeiras cantorias deste sertão Brasil. O pior é nos darmos conta da importância teórica do Cordel, de par com o mais absoluto desconhecimento da maior parte dos versejadores do asfalto. Como não posso publicar a obra inteira, em respeito aos direitos autorais, colocarei aqui apenas a parte teórica:
Sextilha
Sete linhas ou sete pés
Moirões
Moirão de sete pés
Moirão trocado
Moirão que você cai
Moirão voltado
Décima
Martelo agalopado
Galope a beira-mar
Parcela
Quadrões
Quadrão trocado
Gabinete
Toada alagoana
Meia quadra
Dez pés de queixo caído
Gemedeira
Quadra
Quadra simples
Quadra oposta
Quadra cruzada
Quadra persa
Variante da quadra persa
Ligeira
Gêneros da Poesia Popular
[Teoria do Cordel]
in
Antologia Ilustrada dos
Cantadores
de
Francisco Linhares
&
Otacílio Batista
2ª Ed. UFC, págs. 23/39
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Entre as criações dos poetas clássicos, que vieram a ser usadas pelos nossos cantadores, estão a Quadra, a Décima, a Sextilha em decassílabo com rimas cruzadas, e sua variante.
A Sextilha com rimas cruzadas originou-se da Oitava de Ariosto, estilo que Sá de Miranda (irmão de Mem de Sá), introduziu em Portugal, no século XVI, e que possibilitou a Camões realizar sua imortal obra "Os Lusíadas".
Contando-se com os gêneros mais usados, com os de pouca utilização, ou com os que se encontram completamente abandonados para o improviso, a "Poesia Popular" possui trinta e seis modalidades, número verdadeiramente espantoso, que vem, através dos tempos, demonstrar o grande poder criativo dos nossos bardos
matutos.
Até à época da famosa peleja de Francisco Romano Caluete com Inácio da Catingueira, o estilo preferido pelos cantadores era a Quadra. Após isso, apareceu a Sextilha, pertencente à família dos setessílabos, modalidade essa usada, não só nos grandes debates, mas, também, na abertura de qualquer programa de viola. "É a Deusa inspiradora dos poetas repentistas". Faremos, a seguir, um estudo dos principais gêneros usados pelos nossos violeiros.
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1. - Sextilha:
Talvez, por ser mais fácil, seja o gênero preferido pelos nossos repentistas, principalmente no início das apresentações. A Sextilha é uma estrofe com rimas deslocadas, constituída de seis linhas, seis pés ou de seis versos de sete sílabas, nomes que têm a mesma significação. Na Sextilha, rimam as linhas pares entre si, conservando as demais em versos brancos. Leandro Gomes de Barros, grande escritor da Literatura de Cordel, filho de Pombal, Estado da Paraíba, escreveu:
Meus versos inda são do tempo
Que as coisas eram de graça:
Pano medido por vara,
Terra medida por braça,
E um cabelo da barba
Era uma letra na praça.
Outro exemplo que daremos é o do ceguinho anônimo, que, após a morte de sua desventurada mãe e guia, chorou, com os olhos d'alma, seu infortúnio:
Já tive muito prazer,
Hoje só tenho agonia!
Não sinto porque sou cego,
Eu sinto é falta do guia!
Quando mamãe era viva,
Eu era um cego que via!
Ou, ainda, a de Francisco Pequeno, repentista paraibano, nesta inteligente análise:
Uma morrinha no gado
É derrota em fazendeiro,
E um cavalo ruim
derrota dum vaqueiro!
A derrota do país
É dever no estrangeiro!
2. - Sete Linhas ou Sete Pés
No início do século atual, o Cantador alagoano Manoel Leopoldino de Mendonça Serrador fez uma adaptação à Sextilha, criando o estilo de sete versos, também chamado de sete linhas ou de sete pés, rimando os versos pares até o quarto, como na Sextilha; o quinto rima com o sexto, e o sétimo com o segundo e o quarto. Exemplifiquemos com o próprio criador do gênero:
Amigo José Gonçalves,
Amanhã cedinho, vá
A Coatis, onde reside
Compadre João Pirauá;
Diga a ele dessa vez,
Que amanhã das seis a seis,
Deus querendo, eu chego lá!
José Duda do Zumbi (Manoel Galdino da Silva Duda), no ocaso da vida, com a experiência da idade, disse para José Miguel, jovem companheiro, com quem duelava:
Fui moço, hoje estou velho!
Pois o tempo tudo muda!
Já fui um dos cantadores
Chamado Deus nos acuda ...
Este que estão vendo aqui
Foi Zé Duda do Zumbi!
Hoje Zumbi do Zé Duda!
3. - Moirões:
Dentro da contextura da Poesia Popular, o Moirão tem sido o gênero a sofrer grandes variações ao longo do tempo. "É uma modalidade, onde os cantadores se revezam dentro da mesma estrofe. No século passado, o Moirão em quintilha substituiu o Moirão de seis versos, ambos em desuso. No Moirão de seis linhas, um Cantador fazia dois versos, o outro intercalava com dois, e o iniciante fechava a estrofe. Vejamos um Moirão de seis linhas, cantado por Romano e Inácio:
I Seu Romano, estão dizendo
Que nós não cantamos bem!
R Pra cantar igual a nós,
Aqui, não vejo ninguém!
I E o diabo que disse isto
É o pior que aqui tem!
No Moirão de cinco versos, que veio depois do de seis, havia um revezamento dos cantadores, nas duas linhas iniciais da estrofe, cabendo ao primeiro os três últimos versos para o fechamento da estância. Do encontro entre os paraibanos Romano Elias da Paz e Francisco Pequeno, colheu-se:
F.P. No Mourão não deixo nó!
R.E. O meu eu lavro de enxó!
F.P. Colega, estou pesaroso ...
No recinto primoroso,
Sei que fico a cantar só!
4. Moirão de sete pés:
O Moirão de sete pés é o mais usado atualmente. Formado por uma estrofe de sete linhas, cabendo, ao iniciante, a formação de cinco versos, isto é, os dois primeiros e os três finais; enquanto a cargo do segundo cantador ficam os versos de ordem três e quatro. Os pernambucanos Agostinho Lopes dos Santos e José
Bernardino de Oliveira assim iniciam um duelo:
A.L. Não vã você achar ruim
Este Mourão a doer!
J.B. Eu acredito, Agostinho
Naquilo que posso ver!
A.L. Companheiro, não se gabe,
Que a pessoa que não sabe,
Agrava a Deus sem querer!
Esse gênero pode ser cantado por três violeiros. Pedra Azul inicia:
Vou dar começo à questão
Pra ver quem ganha no fim!
Canhotinho, referindo-se a Severino Pinto, que tomava parte da porfia, foi mais agressivo:
Eu morro e não tenho medo
Dum Pinto pelado assim!
Pinto, que não perdoa, finalizou violento:
Sou pelado, sem canhão,
Por causa de um beliscão
Que tua mãe deu em mim!
5 - Moirão trocado:
A diferença deste gênero para o anterior está exclusivamente no aparecimento de palavras que se alternam nas quatro primeiras linhas da estância. Lourival Batista e Severino Pinto dão uma demonstração deste estilo:
L. Eu, da graça, faço o riso,
E, do riso, faço a graça!
P. E da massa, faço o pão,
E do pão, eu faço a massa!
L. Você desgraçou a peça:
Que u'a misturada dessa
Não há padeiro que faça!
6 - Moirão que você cai:
É um gênero muito apreciado, com versos de sete sílabas, como nos demais, onde as estrofes aparecem com doze linhas, havendo quatro versos comuns a elas: terceiro, sexto, nono e décimo segundo. O iniciante é responsável pela formação dos versos: primeiro, segundo, terceiro, sétimo, oitavo, décimo, décimo primeiro e
décimo segundo. Ficando os demais a cargo do parceiro intercalante. Apreciemos, com Lourival e Otacílio, um Moirão que você cai:
L. Meu irmão, a hora é esta,
De travar-se um desafio!
Lá vai uma, duas e três ...
O. Mas, em luta eu não confio
Porque desanima a festa!
Lá vai quatro, cinco e seis ...
L. Meus versos ninguém detesta
Porque desafio distrai!
O. Cuidado que você cai...
L. Caio tomando sorvete,
Você levando cacete,
Se for por dez pés lá vai!
7 - Moirão voltado:
Gênero relativamente novo, com estrofe de treze versos de sete sílabas, em que os preliantes vão se alternando até a oitava linha, para, em seguida, unirem suas vozes, como em coro, neste estribilho:
Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
Em seguida, repetem a oitava linha com o estribilho acima. Para melhor compreensão, imaginemos os cantadores A e B:
A. Tudo, neste mundo, volta.
B. Com você, combino eu!
A. Volta o rico e o plebeu;
B. Volta quem prende e quem solta ...
A. Volta a paz e a revolta;
B. Volta o sim e volta o não!
A. Volta até Napoleão
B. Que há tempo está sepultado...
A/B Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
Que há tempo está sepultado...
Isso é que é Mourão voltado,
Isso é que é voltar Mourão!
8 - Décima:
Embora de origem clássica, é a Décima um estilo muito apreciado, desde os primórdios da Poesia Popular, principalmente por ser o gênero escolhido para os motes, onde os cantadores fecham cada estrofe com os versos da sentença dada, passando a estância a receber a denominação de glosa. Como o próprio nome diz, Décima é uma estrofe ou estância de dez versos de sete sílabas, assim distribuídos: o primeiro, rima com o quarto e o quinto; o segundo, com o terceiro; o sexto, com o sétimo e o décimo, e o oitavo, com o nono. De Antônio Ugolino Nunes da Costa (Ugolino do Sabugi), primeiro grande Cantador brasileiro, extraímos duas estrofes, em Décima, de seu famoso poema "As obras da Natureza":
As obras da Natureza
São de tanta perfeição,
Que a nossa imaginação
Não pinta tanta grandeza!
Para imitar a beleza
Das nuvens com suas cores,
Se desmanchando em louvores
De um manto adamascado,
O artista, com cuidado,
Da arte, aplica os primores.
Brilham, nos prados, verdumes
De um tapete aveludado;
Brilha o rochedo escarlado,
Das penhas seus altos cumes;
Os montes formam tais gumes,
Que a gente, os observando,
Vê como que se alongando,
Sumir-se na imensidade...
Nossa visibilidade
os perde se está olhando.
O mote é uma sentença ou pensamento, formado de um ou dois versos, com que se finalizam as estrofes. Os primeiros motes eram dados em Quadra, ficando o poeta obrigado a improvisar quatro Décimas, contendo cada uma, pela ordem, um verso ou linha da Quadra. Com a evolução, o mote passou de quatro versos para dois, e, mais raramente, usa-se o de um verso. O mote de duas linhas pode-se apresentar de duas maneiras. Na primeira, já em desuso, a quarta linha da estrofe é formada pelo primeiro verso do mote e a décima pelo segundo. Exemplifiquemos com o mote dado pelo Dr. Raimundo Asfora, descendente de árabe, ao companheiro Otacílio Batista:
Tenho n'alma as tatuagens
Da minha origem cigana.
Apreciemos a técnica do valoroso artista, na formação das estrofes:
Fui criado entre as miragens,
Na solidão do deserto,
De um povo que andava incerto,
Tenho n'alma as tatuagens:
São abstratas imagens
De Alá, que não se profana;
Dos chefes de caravana,
Me orgulho em ser porta-voz:
Os primitivos heróis
Da minha origem cigana!
Os antigos personagens,
Defensores dos escravos;
De uma legião de bravos,
Tenho n'alma as tatuagens!
Fugindo às velhas linhagens
Da imposição duridana,
Por vontade soberana,
Ismael foi peregrino,
O primeiro beduíno
Da minha origem cigana!
Na segunda, os versos do mote ficam conjugados, isto é, formam as linhas nove e dez da estrofe. Vejamos a Décima com este final comovente:
Ao pé do monte Calvário,
Jesus chorava e gemia!
Junto de dois malfeitores,
Via-se um pobre moribundo:
Era o Salvador do mundo,
Senhor de todos senhores!
Refúgio dos pecadores,
De quem sofre nostalgia!
Se quisesse, sairia
Daquele estado precário:
Ao pé do monte Calvário,
Jesus chorava e gemia!
O mote de uma linha é raramente usado. Seu único verso fecha a estrofe.
9 - Martelo agalopado:
O Martelo atual, criação do genial violeiro paraibano Silvino Pirauá Lima, é uma estrofe de dez versos, em decassílabos, obedecendo à mesma ordem de rima dos versos da Décima. Todavia, sua denominação não vem do fato de ser empregado como meio de os contadores se martelarem durante suas pugnas. Sua significação está ligada ao nome do diplomata francês Jaime de Martelo, nascido na segunda metade do século XVII, que foi professor de literatura na Universidade de Bolonha, portanto, o criador do primeiro estilo. Jaime de Martelo suprimiu duas linhas finais da Oitava de Ariosto, ou Oitava camoniana, formando o que se denominou de Martelo cruzado, isto é, no Martelo antigo a primeira linha rima com a terceira e a quinta; a segunda, com a quarta e a sexta. O exemplo deste gênero está na estrofe do paraibano José Camelo de Meio Rezende:
O orgulho nasceu em noite escura,
E é filho da triste ignorância,
Ao descer o seu corpo à sepultura,
Cai-lhe verme por cima, em abundância,
E seu todo se torna uma figura,
Que nos causa a maior repugnância.
Depois, como variante, apareceu o Martelo com rimas destacadas, também denominado de Martelo solto ou de Sextilha em decassílabo. O diplomata brasileiro Francisco Otaviano utilizou-se deste gênero para cantar suas "Ilusões da Vida":
Quem passou pela vida em branca nuvem,
Num plácido repouso, adormeceu;
Quem não sentiu o trio da desgraça,
Passou pela vida e não sofreu:
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida e não viveu.
Feitas essas considerações sobre os Martelos de seis versos, mostraremos o estilo atual, variante da Décima, criação do violeiro Silvino Pirauá Lima, conforme estrofe do poeta lira Flores, citada pelo Dr. Ariano Suassuna, num trabalho sobre os cantadores:
Quando as tripas da terra mal se agitam,
E os metais derretidos se confundem,
E os escuros diamantes que se fundem,
Da cratera ao ar se precipitam.
As vulcânicas ondas que vomitam
Grossas bagas de ferro incendiado,
Em redor, deixam tudo sepultado
Só com o som da viola que me ajuda,
Treme o sol, treme a terra, o tempo muda,
Eu cantando Martelo agalopado.
Esse gênero belo e difícil via crucis dos fracos repentistas, é empregado não só nos grandes debates, mas nos trabalhos escritos, em geral.
10 - Galope à beira-mar:
Gênero muito apreciado pelos apologistas da Poesia Popular que, juntamente com o Martelo, recebeu a denominação de Décima de versos compridos. O Galope é assim chamado em virtude de ser empregado mais em temas praieiros. È constituído de uma estrofe de dez versos de onze sílabas, com o estribilho cuja palavra final é mar.
Foi criado pelo violeiro cearense José Pretinho (não o da peleja do cego Aderaldo), filho de Morada Nova, vaqueiro do "coronel" José Ambrósio, falecido em Lavras da Mangabeira. Contam que José Pretinho, após levar uma surra, em Martelo, de Manoel Vieira Machado, cantador piauiense, veio a Fortaleza e, na Praia de Iracema, observou o mar, cujo movimento das ondas se parecia com o galope dos cavalos da fazenda do "coronel" Ambrósio. Criado o estilo, procurou o adversário para a desforra. Deixou-o aniquilado. Mergulhão de Sousa divulgou o gênero por todo o Nordeste. Dimas Batista, cantando no Teatro Santa Isabel, em Recife, improvisou sob aplausos:
Eu cantando a Galope ninguém me humilha,
Tudo que existe no mar eu aproveito,
Na ilha, no cabo, península, estreito,
Estreito, península, no cabo, na ilha,
Em navio, em proa, em bússola e milha!
Medindo a distância para viajar,
Não quero, da rota, jamais me afastar,
Porque me afastando o destino saí torto;
Confio em Deus avistar o meu porto,
Cantando Galope na beira do mar!
José Limeira, Poeta do Absurdo, dá-nos exemplo de tremendo disparate:
Conheço, demais, o rio Paraíba,
Que nasce sozinho, lá dentro da praia!
Parece um cambito de pau de "cangaia",
As suas enchentes têm mel de tubiba;
Na frente, recebe o rio Furiba,
passa correndo pra Madagascar;
Alaga Recife, demora em Dacar,
No tempo de inverno é seco demais:
Foi quando "Oliveiro" enfrentou Ferrabrás,
Que luta pai-d'égua na beira do mar!
O violeiro cearense Simplício Pereira da Silva, residente na vila de Barreiras, município de Redenção, criou um estilo interessante de Galope, que ele denominou de "Galope por dentro do mato". Trata-se de um gênero que cuida, exclusivamente, de temas sertanejos. As estrofes abaixo são de sua autoria:
Companheiro, eu do mar não conheço nada,
Nunca fui à praia e menos ao banho,
Pois o mar é um lago pra mim tão estranho,
Que parece até um mistério de fada ...
Eu gosto bastante é de uma caçada,
Lá no meu sertão, muito embora que ingrato!
Pra você não pensar que estou com boato:
Uma meia hora vamos pelejar. .
Pegue lá seu peixe por dentro do mar,
Que vou caçar peba por dentro do mato.
No sertão, à caçada, eu fui certo dia,
Num mato fechado, bem desconhecido,
Mas eu, na caçada, fui meio atrevido;
Chegando no mato, o sol já pendia ...
Tinha onça por praga, e eu não sabia;
Saí pisando devagar no sapato;
Senti um mau cheiro, pensei que era gato.
Quando vi a onça e a onça me viu:
E o corpo tremeu e meu rifle caiu...
Foi carreira feia por dentro do mato!
Nota do editor do Jornal de Poesia:
Em matéria de Galope na beira do mar, este, de Luciano Maia, é simples esplendoroso. Clique na figura para ver que perfeição.
11 - Parcela:
A Parcela é uma Décima com versos de quatro ou de cinco sílabas, conhecida também pela denominação de Décima de versos curtos.
Há cantadores que ainda usam a Parcela para a "Despedida", que costumeiramente é feita no final das apresentações. Coutinho Filho, em Violas e Repentes, apresenta duas estrofes, com quatro sílabas em cada verso, da peleja de Pedra Azul com Manoel da Luz Ventania:
Eu sou judeu
Para o duelo!
Cantar Martelo
Queria eu!
O pau bateu,
Subiu poeira!
Aqui na feira,
Não fica gente!
Queima a semente
Da bananeira!
Manoel da Luz Ventania revidou-o pelo ataque a Bananeiras, terra de seu nascimento:
Sou bananeira ...
Do alagadiço!
Você diz isso
Por brincadeira!
Meto a madeira,
Quebro a viola!
Só me consola
Te ver, um dia,
De vara e guia,
Pedindo esmola!
Da peleja de José Félix com o cego Benjamim Mangabeira, recentemente falecido em Fortaleza, colhemos estas Parcelas de cinco sílabas:
J.F.
Sou velho na vida,
Sou feito na arte…
De parte a parte,
Conheço a batida!
Na trilha seguida,
Levanta poeira!
E, na cachoeira,
As águas descendo,
E o povo dizendo:
"Correu, Mangabeira!"
B.M.
Eu dou, tu apanha(s)!
Eu vou e tu fica(s)!
Levando tabica
Por causa da manha!
Foi tua campanha,
Caído no porre…
Eu vivo, tu morre(s)!
É no K, é no L!
Conhece, Zé "Fele",
Mangaba não corre!
Da imortal peleja de José Pretinho com o cego Aderaldo, escrita pelo genial poeta piauiense, de Parnaíba, Firmino Teixeira do Amaral, registramos estas Parcelas de cinco sílabas:
Cego Aderaldo:
Negro é raiz
Que apodreceu!
Casco de judeu,
Moleque infeliz!
Vai pra teu país:
Senão eu te surro,
Dou-te até de murro!
Tiro-te o regalo,
Cara de cavalo,
Cabeça de burro!
Pretinho:
Fale doutro jeito,
Com melhor agrado,
Seja delicado,
Cante mais perfeito:
Olhe, eu não aceito
Tanto desespero...
Cante mais maneiro,
Com verso capaz,
Façamos a paz:
Reparta o dinheiro.
12 - Quadrões:
Ao longo do tempo, o Quadrão tem sido o gênero a receber o maior número de alterações, não só na sua forma interna, mas, também, na estrutura das estrofes, em geral. O Quadrão antigo é formado por uma estância de oito linhas, pertencente à família dos setessílabos, rimando o primeiro verso com o segundo e o terceiro; o quarto com o oitavo, e o quinto com o sexto e o sétimo, contando, no final, o estribilho de sua denominação. Com Lourival Batista, um Quadrão à antiga:
O Cantador repentista,
Em todo ponto de vista,
Precisa ser um artista
De fina imaginação,
Para dar capricho à arte,
E ter nome em toda parte,
Honrando o grande estandarte
Dos oito pés de Quadrão!
Posteriormente, o Quadrão em oito apareceu com ligeira modificação na sua forma interna, isto é, o quarto verso que rimava somente com o oitavo passou a rimar também com o quinto. Numa homenagem póstuma ao ilustre mestre Lacerda Furtado, transcrevemos um Quadrão no novo estilo, por ele escrito e oferecido ao grande cordelista paraibano Joaquim Batista de Sena:
Namorando a Salomé,
Vi a barca de Noé,
Palestrei com Josué,
Com Jacó e Salomão;
Travei luta com Sansão,
Nadei no delta do Nilo,
Montado num crocodilo,
Cantando os oito em Quadrão!
13 - Quadrão trocado:
Com versos de doze sílabas, e conservando a mesma ordem das rimas do estilo anterior, criou-se o Quadrão trocado, gênero que exige muita segurança e desembaraço do repentista; apresentando, a partir da terceira linha, palavras que vão se alternando no verso subseqüente. As duas últimas linhas da estrofe formam o estribilho que se encerra com a palavra Quadrão. O repentista Dimas Batista improvisou esta difícil estrofe:
É no sangue, é no povo, é no tipo, é na raça,
É no riso, é no gozo, é no gosto, é na graça,
É no pão, é no doce, é no bolo, é na massa:
É na massa, é no bolo, é no doce, é no pão;
É cruzado, é vintém, é pataca, é tostão,
É tostão, é pataca, é vintém, é cruzado;
É Quadrão, é Quadrinha, é Quadrilha, é Quadrado,
É Quadrado, é Quadrilha, é Quadrinha, é Quadrão.
Não só na forma, mas na estrutura, o Quadrão sofreu alterações bem acentuadas. Daí, quatro tipos de Quadrões incluídos na Décima; todos com o estribilho na última linha da estrofe.
Coutinho Filho apresenta, de Antônio Batista Guedes, sobrinho de Ugolino do Sabugi, dois tipos de Quadrões. O primeiro diferença-se do segundo por ser este dialogado:
Longe do mar de Netuno,
O cocheiro Faetonte
Percorria o horizonte
No seu coche de tribuno,
De Anfitrite e de Juno,
Tinha ele a proteção!
Apolo, tendo na mão
Um livro de poesia,
Me ensinou com galhardia
Cantar dez pés em Quadrão!
A. Júpiter onipotente,
B. Tendo o trono conquistado,
A. Por ter seu pai expulsado,
B. Do céu traiçoeiramente
A. Porque, de reinar somente,
B. Era a sua pretensão!
A. Da maior constelação,
B. Íris, num carro, desceu,
A. E a inspiração me deu
B. Nestes dez pés a Quadrão!
O Quadrão dialogado apresenta-se agora, com uma pequena modificação: o último verso deste novo tipo é cantado pelos dialogantes, e não por um só, como no caso anterior. A estrofe que se segue é de um desafio dos cantadores cearenses Simplício Pereira da Silva e Manoel Furtado, quando dialogavam, fazendo referências a um sapo que penetrava no salão, onde contavam:
S.P. Colega, lá vem um sapo,
M.F. Ou por outra, um cururu!
S.P. Não vem vestido nem nu,
M.F. Porém vem batendo o papo!
S.P. Eu, nele, dou um sopapo!
M.F. Boto fora do salão ...
S.P. Pego, nele, com a mão;
M.F. Depois rebolo no mato ...
S.P. O guaxinim come o fato,
S.P. e M.F. Lá se vai dez a Quadrão!
Há pouco, os irmãos Batista criaram este gênero de Quadrão em dez, que se diferença do estilo anterior, apenas por ser constituído de perguntas e respostas, o que vem a exigir grande parcela de esforço e de dom poético: cada pergunta deve ser respondida com inteligência e segurança, para o bom êxito da estrofe. Imaginemos dois cantadores (A e B), num duelo cerrado:
A. Para que serve a ciência?
B. Para evoluir o mundo.
A. Para que serve um segundo?
B. Para aumentar a existência.
A. Para que serve a seqüência?
B. Pra dar continuação.
A. Pra que serviu Lampião?
B. Pra dar trabalho a soldado,
A. Naquele tempo passado...
A e B. Lá se vai dez a Quadrão!
14 - Gabinete:
Gênero que foi muito apreciado pelo imortal cego Aderaldo, porém de pouco uso atualmente. É cantado em versos de sete sílabas, sem número de linhas determinado, e com estribilhos nas linhas: sete, oito, nove, dez e nas duas últimas. Otacílio Batista exemplifica:
O povo deseja ouvir
Um Gabinete bonito;
Poeta, só acredito
Se você não me mentir.
Trate de se prevenir
Para poder cantar bem
Eu comprei um cartão
Para viajar no trem:
Sem cartão ninguém vai,
Sem cartão ninguém vem!
Vai e vem, vem e vai,
Vem e vai, vai e vem.
Quem não tem o que eu tenho,
Morre danado e não tem!
Quem estiver com inveja,
Se esforce e faça também ...
Cavalo bom é ginete;
Quem não canta Gabinete,
Não é cantor pra ninguém!
O violeiro cearense, Alberto Porfírio, criou um estilo de Gabinete mais interessante e simplificado: o Cantador faz uma Quadra, em seguida, seis versos de onze sílabas, com rimas que se casam (rimas iguais), desenvolvendo, nestes, o tema da Quadra. Para finalizar, faz três versos de sete sílabas, rimando o primeiro com a estribilho (Quem não canta Gabinete), e o terceiro com os versos da Sextilha. O exemplo abaixo é do próprio criador do estilo:
Quem é forte não se gaba,
Não se altera nem se agita,
Mas qualquer homem se acaba
Por uma mulher bonita!
Amei uma jovem que me queria bem,
Eu gostava dela mais do que ninguém;
Chegou lá um cabra mexendo xerém,
Mas eu tendo raiva, não temo a quem vem!
De faca e de bala, eu brigo com cem...
Quebramos cadeira, víramos um trem!
Resolvi foi no cacete;
Quem não canta Gabinete,
Não se diz que canta bem.
15 - Toada alagoana:
É um gênero pouco usado, porém muito bonito, em virtude das rimas encadeadas e da agradável toada. Sirvo-me de uma estrofe de Otacílio Batista, companheiro de trabalho, para mostrar este gênero:
Vai Otacílio Batista,
Repentista,
Neste momento tão forte,
Num estilo diferente,
No repente,
Correndo em busca da sorte...
Em noite de lua cheia,
Sou a sereia
Dos oceanos do norte!
Ao lado da toada alagoana, existe o Martelo alagoano, cuja diferença do Martelo agalopado está na toada, que é um pouco mais lenta, bem como no estribilho, que apresenta no final das estrofes com a palavra de sua denominação.
16 - Meia quadra:
Entre as modalidades mais difíceis da Poesia popular, está a Meia Quadra, estilo que apresenta estrofes com número de versos não determinados, e com quatro linhas iguais na parte final:
Quando eu disser vida e meia,
Você diga meia vida;
Quando eu disser ida e meia,
Você diga meia ida,
Quando eu disser lida e meia,
Você diga meia lida.
Diga coração e meio.
Se eu disser meio coração;
Se eu disser meia baleia,
Você diga meio cação,
Se eu disser meio cação,
Você diga meia baleia;
Quando eu disser Meia Quadra,
Você diz que é Quadra e Meia,
Quando eu disser Quadra e Meia,
Você diz que é Meio Quadrão!
17 - Dez pés de queixo caído:
Este gênero, ainda em voga, está incluído na Décima, apresentando, no final de cada estrofe, este estribilho: "NOS DEZ DE QUEIXO CAÍDO":
É tão grande o meu valor,
Que o mundo todo o conhece;
A poesia se oferece...
Eu, dela, sou professor!
Eu não temo a Cantador
Por mais que seja sabido!
Faz tempo que não divido
O que tenho com ninguém:
Assim vou passando bem
Nos Dez de Queixo Caído!
18 - Gemedeira:
Pela própria denominação do gênero, vemos que serve para temas gracejantes. É a Gemedeira um estilo de poesia, caracterizado pela interposição de verso de quatro, ou, raramente, de duas sílabas, entre a quinta e a sexta linhas da Sextilha, formado pelas interjeições: "ai! e ui! ou ai! e hum!" Após cantar outros estilos com José
Soares do Nascimento, Severino Pinto mudou para Gemedeira:
Cantei Mourão a Galope,
Versejando como entendo!
Vou passar pra Gemedeira,
Como me pedem, eu atendo!
Há pouco, cantei me rindo.
Ai! ai! ui! ui!
Agora canto gemendo!
Com a supressão de "ui! ui!", teremos o sexto verso com duas sílabas, conforme estrofe de José Soares do Nascimento:
Sem querer tirar nem pôr,
Você chora e eu também!
Como nos falta dinheiro,
Tira-se, aqui, de quem tem!
Choro de Cantador liso...
Ai! ai!
Não se oculta de ninguém!
Dissemos, no início deste capítulo, que trinta e seis eram os estilos da Poesia Popular. É bem verdade que não descrevemos esse total, pois achamos melhor estudar aqueles ainda em uso, com maior ou menor intensidade. Todavia, considerando seus grandes empregos no passado, faremos um ligeiro estudo sobre a Quadra e sobre a Ligeira.
19 - Quadra:
Definitivamente retirada da área do improviso, a Quadra é constituída de uma estrofe de quatro versos, que podem ser de sete ou de dez sílabas. Todavia, iremos apresentar mais a sete sílabas, por ser a melhor a se enquadrar na temática deste livro.
Quadra simples: Na quadra simples, somente as linhas pares são rimadas, permanecendo as demais em versos brancos.
Doutor Manuelito Eduardo Campos, em sua desabusada obra Cantador, Musa e Viola, traz esta quadra de origem latina (Séc. XIII), mas que ele atribui a José Matos, cearense do Cariri:
No seio da virgem pura
Entrou a Divina Graça
Como entrou, assim saiu
Qual o sol pela vidraça!
Quadra oposta: Tem a denominação acima, em virtude de o primeiro verso rimar com o último. O segundo e o terceiro foram a chamada rima paralela:
Quem ama moça solteira
De Deus, terá perdão:
Porque nosso pai Adão
Teve sua companheira!
Quadra cruzada: O jovem trovador cearense e jornalista gabaritado, César Coelho é o autor destas belíssimas Quadras, que nos escrevemos com satisfação:
Coisa linda é madrugada,
Com luar pelo terreiro,
Viola em beira de estrada,
Cantiga de violeiro.
Quero a paz do teu carinho,
Mil cantigas de viola,
Quero ouvir um passarinho,
Que não seja na gaiola ...
Quadra persa: É assim denominada por ser de criação dos poetas persas. Nela, riam-se as linhas 1ª, 2ª e 4ª. A 3ª constituída de um verso branco.
O brilhante a respeitável mestre, Rebouças Macambira, dá-nos este exemplo ao traduzir o poema Rubayat, do imortal Omar Khayan:
Desperta que a rabugenta madrugada
Do céu espanta a noite constelada
E sol envolve a torre da mesquita
Em feixe de luz avermelhada.
20 - Ligeira:
Como a Quadra, a Ligeira está afastada totalmente do terreno do improviso. Sua denominação vem do fato de ser cantada com a maior rapidez possível. O Cantador fazia versos de sete sílabas, com rimas obrigatórias para os de ordem par, e sem número de linhas determinado.
No capítulo anterior, temos um exemplo de Ligeira, na saudação do poeta Manoel Bandeira aos violeiros do Nordeste. Finalizando o estudo sobre os gêneros principais da Poesia Popular, confessamos que o fizemos com o propósito de prestar, aos amantes da nossa "Poesia Bárbara", certos esclarecimentos que há tempos eram esperados.
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